Monólogo “Eu sou um Hamlet” com Rodrigo França volta a entrar em cartaz no Rio

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Pouco tempo após receber a indicação ao Prêmio Shell na categoria Música, assinada na peça por Dani Nega, o monólogo “Eu sou um Hamlet” volta à cena no Teatro Ipanema Rubens Corrêa, no Rio de Janeiro, sob direção de Fernando Philbert. A peça marca o retorno de Rodrigo França ao teatro como ator cinco anos após ter interpretado Martin Luther King Jr. nos palcos, estando agora na pele do clássico personagem conflituoso de William Shakespeare

Se valendo da tradução realizada por Aderbal Freire-FilhoWagner Moura e Barbara Harrington para o texto do bardo, a adaptação foi escrita por Jonathan Raymundo, Philbert e França – os dois últimos retomando a parceria iniciada no espetáculo “Contos Negreiros”.

Rodrigo França interpretando na peça “Eu sou um Hamlet” / Foto: Marcio Farias

Utilizando as falas de Hamlet, a montagem coloca um espelho diante do mundo e reflete este tempo violento e pleno de segregações. Assim, nos evoca questionamentos acerca da sociedade de hoje, das relações humanas e da sua própria condição de humanidade enquanto homem negro no Brasil em sua jornada de autoconhecimento. Uma das primeiras dramaturgias do ocidente que busca refletir a humanidade, a peça amplia os seus dilemas a partir de um ator negro em sua encenação. A proposta é trazer essa consciência da realidade ao personagem. Ser ou não ser? Estar consciente ou não?

Lançando luz ao mito da democracia racial no Brasil – ou no reino da Dinamarca – esse Hamlet negro está diante no dilema de encontrar um discurso capaz de fazer repensar o hoje. Dilema este que levou o próprio Rodrigo França a se questionar se deveria ser ou não ser o emblemático personagem nesta montagem. Reforça perceber como essa tragédia colonial gerou uma espécie de homem negro esvaziado de si mesmo e tendo que piratear uma humanidade falsa, capenga, sempre sob suspeita, sempre no limite.

O que se passa no negro quando ele se torna consciente da sua condição? Da vulnerabilidade da sua segurança, nos jogos e sistemas que o coloca nas posições sociais mais degradantes, na justiça que, ao invés de cega, o enxerga sempre e mais. Como não surtar? Como não querer se matar ou matar? Como suportar a vida neste mundo? É preciso que os ancestrais voltem para iluminar um coração à beira do abismo, em meio a batalha com esta cultura de monstros.

Shakespeare foi popular em sua época, o século XVI, ao encenar peças que se comunicavam com os mais diferentes tipos de pessoas, de nobres a populares. Não será diferente em nossa montagem. Não gosto da arte para poucos, com muros. Quero que a tia do Complexo do Alemão saia do teatro contemplada, assim como a madame do Leblon”, profere Rodrigo França. Junto de Fernando, tiveram a ideia da montagem durante um papo no bar que levava o nome do pai de França, na Lapa.

Pensamos em fazer um Hamlet com um recorte sobre o racismo e o pensamento sobre o homem comum diante desta sociedade que ameaça os direitos e liberdades. Apresentamos um Hamlet que observa a tensão do mundo e quer entender como se chegou a isto. ‘Hamlet’ é a peça que lança o ser humano como objeto de pensamento ao refletir sobre o que pode aguentar diante do mundo e suas engrenagens que esmagam uma pessoa negra, LGBT, pobre, que luta por justiça que deseja ir de encontro às regras sociais que privilegiam o poder. Em nossa montagem Rodrigo pensa e busca entender o que está em sua volta e, nesta batalha solitária, as vozes dos ancestrais lhe traz coragem para seguir e desafiar os augúrios”, antecipa Philbert.

Para Rodrigo, estar à frente desta montagem é importante, sobretudo, para poder mostrar que os artistas negros podem fazer qualquer personagem. “E é incrível pegar este texto, que reflete o ser humano, e colocar no corpo e na voz de um ator negro. A peça respeita a obra de Shakespeare e, mesmo assim, sugere outros lugares que ainda não foram mostrados. Porque amor, ódio, fúria e vingança são pautas universais, mas que diferem pela subjetividade que cada grupo propicia. Tais sensações são naturais, mas como se sente é construído socialmente. Este homem negro buscando descobrir quem matou seu amado pai vai para outro contexto”, reflete França.

Para o ator, que divide seu tempo ainda como diretor, debatedor, filósofo, autor e escritor, a população negra ainda está em busca de ser humanizada no Brasil. “Só é tratado como humano aqueles que tem dignidade em suas estruturas. Estamos longe de uma equidade para existir uma reparação de nossas mazelas causadas pela escravização. Contextualizando ‘Hamlet’, os nossos fantasmas (ancestrais) ainda clamam. O Hamlet de Shakespeare quer vingança; no Brasil, os diversos ‘Hamlets’ só querem justiça. Imagina se quisessem vingança? Não posso dispersar, pois os meninos estão morrendo lá fora. E temos muito o que fazer”, finaliza Rodrigo França.

SERVIÇO:

EU SOU UM HAMLET” – @eusouumhamlet

Temporada: 13 de setembro a 06 de outubro

Dias da semana: Sexta-feira às 20h; Sábado e Domingo às 19h

Link de vendas: https://linktr.ee/EUSOUUMHAMLET?fbclid=PAZXh0bgNhZW0CMTEAAabT30l_Zk7C9TNgSv3POkEOXdYatfTrhaI00q1pCdkkpw2ZxKXWH9yB–E_aem_PwbEz76QA3K1yTouWseUFg

Local: Teatro Ipanema Rubens Corrêa

Endereço: Rua Prudente de Moraes, 824 – Ipanema 

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