Um levantamento do Instituto Sou da Paz revela que apenas 37% dos casos de homicídios no Brasil geraram denúncia à justiça no ano de 2020. No estudo “Onde Mora a Impunidade? Porque o Brasil precisa de um Indicador Nacional de Esclarecimento de Homicídios”, o Instituto revela ainda que, dos 19 Estados que enviaram que enviaram dados completos para o cálculo do indicador de esclarecimento, apenas nove enviaram algum dado sobre o perfil das vítimas.
Além disso, o relatório mostra também que 76% dos homicídios foram realizados por armas de fogo e Ministérios Públicos e Tribunais de Justiça de oito estados ainda não conseguem produzir dados necessários para o cálculo do indicador: Alagoas, Amazonas, Goiás, Maranhão, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Sergipe e Tocantins.
Para Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, o apagão de dados sobre raça/cor é preocupante. “O desenho de políticas não pode deixar de levar em consideração que há uma parcela da população afetada pela violência letal de forma desproporcional em razão do racismo, da discriminação e da desigualdade de renda. A ausência desses dados evidencia que as instituições do sistema de Justiça responsáveis pelo processamento de um homicídio desconsideram a relevância dessas informações para o aprimoramento da sua atuação”, comenta.
Ela lembra ainda que o baixo percentual nacional de esclarecimento de homicídios e a enorme variação entre os estados mostra que o Estado brasileiro ainda tem muito a avançar para aumentar a resposta a esses crimes, garantido aos familiares e à sociedade o direito à verdade e a justiça em relação a essas vítimas.
“A análise sobre o percentual dos homicídios esclarecidos ajuda a mostrar que o país precisa priorizar e reforçar sua capacidade de investigar e processar esses crimes, que são os mais graves e que atentam contra a vida das pessoas”, afirma.
Percentual por Estado
O levantamento também leva em consideração os percentuais de esclarecimentos dos crimes por ente federado. Rondônia apresenta o maior percentual de resolução, chegando a 90% dos casos. Já o Rio de Janeiro é o menor percentual, com 16% dos crimes gerando denúncia às instâncias judiciárias.
“Sabemos que nosso sistema de segurança pública e de justiça criminal ainda foca muitos esforços nos crimes patrimoniais e em outros sem violência, impulsionando prisões provisórias que lotam o já saturado sistema prisional. É preciso dirigir os esforços e os investimentos, sobretudo, para a investigação e esclarecimento dos crimes contra a vida, onde, de fato, mora a impunidade”, analisa.
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Transparência
A coordenadora da pesquisa, Beatriz Graeff ressalta a importância de os Estados disponibilizarem os dados e comemora que todos eles enviaram resposta ao Instituto. “Dezenove estados enviaram respostas com a qualidade necessária para compor o Índice Nacional de Esclarecimento de Homicídios, um avanço importante em relação à primeira edição, de 2017, quando apenas seis estados foram capazes de produzir os dados necessários”, comenta Graeff.
Ainda de acordo com o Instituto, o motivo de alguns estados não entrarem no cálculo foi o envio de dados incompletos – porque não havia data do homicídio ou porque havia um percentual acima de 20% de dados incompletos – que impossibilitaram o cálculo do indicador.
Sobre o Índice Nacional de Esclarecimento de Homicídios
O Instituto Sou da Paz atua frente a atores institucionais diversos para a criação de um Indicador Nacional de Esclarecimento de Homicídios oficial e realiza desde 2017 a coleta de dados junto aos 26 estados brasileiros e ao Distrito Federal para apoiar o cálculo e a publicação de um indicador nacional de esclarecimento de homicídios. Esses esforços têm se concentrado no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e também no Congresso Nacional, onde há dois projetos de lei (PLs) que tramitam tanto no Senado Federal, quanto na Câmara dos Deputados, com o objetivo de promover a publicação regular de índices de elucidação de crimes, entre eles, o homicídio e o feminicídio.