Temática racial é destaque na programação do SESC RJ

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A presença da temática racial, seja por meio da cultura ou da educação, está cada vez mais presente dentro da programação cultural do Sesc RJ. São inúmeros espetáculos teatrais e musicais, exposições, apresentações de dança, oficinas e outras expressões e manifestações culturais e educativas oferecidas à população fluminense com a questão racial no centro do debate. 

O edital “O Corpo Negro” e a apresentação da terceira edição do festival de dança O Corpo Negro, além do Projeto Consciências, são importantes exemplos do trabalho desenvolvido pelo Sesc RJ na busca por maiores representatividade e oportunidades para a população preta do estado fluminense. 

Atriz Ana Carbatti na peça “Ninguém Sabe Meu Nome” /Foto: Renato Mangolin

Para Moisés Nascimento, Analista de Literatura do Sesc RJ, as iniciativas citadas são grandes exemplos de trilhas institucionais importantes conduzidas pelos Programas de Cultura e Educação da instituição para algo que ele considera fundamental para a sociedade brasileira: “o papel basilar dos povos e das culturas afrodiaspóricas e indígenas no processo civilizatório disso que compreendemos como país”.

O analista também diz que a inserção desse tema na programação do Sesc RJ vai na contramão do apagamento da presença da cultura negra na sociedade. “É uma forma de, em primeiro plano, dar visibilidade a algo incontornável na própria concepção do nosso imaginário social e ampliar, dar diversidade ao capital simbólico de nossa clientela preferencial (trabalhadoras e trabalhadores do setor do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) e para o público em geral”.

Moisés destaca ainda que essas iniciativas são respostas institucionais ao fato do Brasil, principalmente o Rio de Janeiro, ser um lugar com mais da metade da população composta de pessoas pretas, pardas e indígenas. “Isso, para além de ser um dado demográfico, implica, significa e importa no que pensamos e elaboramos como país em níveis social, econômico e cultural”, afirma o analista, que continua: 

“Se, estatisticamente, falamos de quase 60% da população; se, economicamente, é um dado do IBGE que 50% do quantitativo trabalhador é de pessoas negras; e se só é possível falar de Brasil no campo cultural a partir de uma perspectiva racializada, a programação institucional do Sesc RJ precisa ter e tem como pauta a visibilidade dessa presença.” 

A atriz Ana Carbatti, do elenco da peça teatral “Ninguém Sabe Meu Nome”, que faz parte da programação cultural do Sesc RJ, explica como enxerga o trabalho desenvolvido pela instituição:

 “É o Sesc RJ assumindo sua responsabilidade como instituição social. O teatro brasileiro decidiu tomar pelo chifre esse desvio moral, que é o racismo e suas diversas e perversas formas – como já o fez tantas vezes anteriormente, e é fundamental que todas as instituições façam seu papel nessa demanda.” 

Espetáculo “Manifesto Elekô”, da Cia.de Dança Clanm que se apresentou no Festival “O Corpo Negro” – Foto: Fernando Souza

Apesar de acreditar que o racismo não será completamente erradicado, a atriz percebe no Sesc RJ a possibilidade de transformar a sociedade: “Acredito, sim, que todas essas ações conjuntas, desafiem a normatização das práticas racistas e transformem política e culturalmente a sociedade. E o Sesc, em sua abrangência nacional, desempenha seu papel”, acrescenta. 

Ana garante que ter a peça na qual atua, que aborda a história de uma mãe e um filho sob o viés racial, como parte da programação da instituição, é extremamente importante e positivo para sua arte.

“Essa possibilidade de circular com o espetáculo por diversos locais é exatamente o que um espetáculo teatral precisa para amplificar seu argumento e se materializar”, diz ela.  

E pensando tanto no contexto de sua peça, quanto no trabalho desenvolvido pelo Sesc RJ, com as iniciativas que trabalham a temática racial no combate ao racismo e na promoção e visibilidade da cultura negra, Ana reafirma a importância de ter esse debate dentro das abordagens propostas pela arte e pela cultura, por meio dos projetos.

Leia também: “O Projeto Consciências tem compromisso de tornar a temática racial uma agenda sistemática”, afirma Adriano Rocha, Analista de Educação do Sesc RJ

Projetos com temática racial do Sesc RJ

“O debate racial tem inúmeras camadas sutis e substanciais, e um produto cultural consegue atravessar essas camadas, usando o entretenimento como ferramenta de formação, de transformação, de comunicação. Como artista, eu não consigo me imaginar num espetáculo que não corresponda de forma crítica, ética e artisticamente às minhas crenças”, conclui a atriz.

O analista de Literatura do Sesc RJ, Moisés Nascimento, coloca em evidência outros projetos criados pela instituição, como o “Palavra Líquida” de 2022, na área da Literatura, que teve como um dos temas o cantor, compositor, dramaturgo e escritor Altay Veloso, que segundo Moisés, obteve um importante retorno positivo por parte do público:

“Nosso trabalho como equipe foi levar o projeto para a Unidade São Gonçalo, território de Altay, para que ele fosse homenageado em vida em sua própria cidade. Ali, construímos toda uma programação multilinguagem, a partir da obra de Altay, que contou com artistas da região, apresentando suas canções, além de espetáculos cênicos elaborados a partir de sua obra, e um documentário inédito produzido pelo Sesc RJ, lançado durante o evento. Foi uma programação formativa voltada para a reflexão sobre o trabalho do artista”, conta. 

Moisés também cita outro projeto de 2022, o “Núcleo Afrodiaspórico”, realizado na Unidade Sesc Três Rios, também da área de Literatura, que, inicialmente, só buscava refletir sobre os processos literários pelo viés racial.

“O trabalho se expandiu para um mapeamento dos “Lugares de Memórias e Expressão Artística Negra” na cidade. O resultado foi uma outra cartografia de Três Rios, revelando-nos uma cidade negra em muitos dos aspectos até então invisível para nós”, diz Moisés, acrescentando que a troca com o público foi muito boa: “É o que buscamos quando racializamos nossos processos.” 

“Xangô”, obra de Emanoel Araújo, de 2021 da exposição “ÀMÌ: Signos Ancestrais” /Foto: Acervo Galeria Simões Assis.

O analista elenca ainda outros projetos que seguem a mesma linha, como o Edital de Cultura Sesc RJ Pulsar, que ele descreveu como uma ação que, embora tenha “como meta ocupar a grade anual da instituição, um dos seus critérios avaliativos é a diversidade, inclusão e representatividade em uma perspectiva interseccional e geográfica.” E acrescenta: 

“Importante também trazer a informação dos Núcleos Feminismos (Unidade Sesc Niterói), Infância e Juventude (Unidade Sesc Tijuca) e Contação de Histórias (Unidades Sesc Nova Iguaçu e São João de Meriti). Todos eles são projetos que pautam a questão racial e de gênero em todas as suas dimensões. Importante ressaltar também o projeto Mulheres Plurais, do Programa de Assistência. Para além da diversidade de gênero, é um projeto que também racializa sua programação. Um dos desdobramentos dele é o “Saber-se Negra”, braço vital do que o Sesc RJ tem articulado com esse viés.” 

Programação

A exposição “Um oceano para lavar as mãos”, aberta ao público no Centro Cultural Sesc Quitandinha até o dia 15 de outubro, tem a temática racial como ponto central, com 40 obras que propõem uma revisão da História do Brasil, pensada por curadores e artistas negros. 

Já a exposição “ÀMÌ: Signos Ancestrais”, em cartaz no Centro Cultural Arte Sesc, na Rua Marquês de Abrantes 99, no Flamengo, reúne artistas como Guilhermina Augusti, Raphael Cruz e Emanoel Araújo, que lidam com o jogo da figuração e da abstração em diálogo com os signos afrodescendentes.

Leia também: Exposição “Um oceano para lavar as mãos” valoriza o protagonismo negro nas artes e ocupa o Centro Cultural Sesc Quitandinha

No caso das peças teatrais, há a “Ninguém sabe o meu nome” protagonizada por Ana Carbatti, um espetáculo solo que reflete sobre os códigos racistas tácitos da sociedade, seus impasses, impactos e possíveis propostas de reparo. A peça percorre cinco Unidades Sesc RJ, a partir de 30 de junho até 20 de julho, chegando a Niterói, São João de Meriti, Ramos, Rosinha de Valença e Barra Mansa. Já a peça “Yerma em Banzo”, espetáculo multimídia em cartaz no Sesc Tijuca até 2 de julho, revisita o poema trágico do artista espanhol Federico García Lorca. Ambas têm entradas com preços acessíveis, com valores entre R$ 5 e R$ 30. 

Moisés deixa ainda mais uma dica para quem quer acompanhar os projetos antirracistas do Sesc RJ: “Chamo a atenção do público para o Festival Sesc de Inverno, que acontece na Região Serrana, a partir de 14 de julho, e o projeto Palavra Líquida, entre 15 e 24 de setembro, nas unidades da Baixada Fluminense”. 

A programação completa das atrações culturais do Sesc RJ você encontra no site:  www.sescrio.org.br

Bárbara Souza

Bárbara Souza

Carioca da gema, criada em uma cidade litorânea do interior do estado, retornou à capital para concluir a graduação. Formada em Jornalismo em 2021, possui experiência em jornalismo digital, escrita e redes sociais e dança nas horas vagas. Se empenha na construção de uma comunicação preta e antirracista.

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