O Papa Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, morreu nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, às 2h35 pelo horário de Brasília (7h35 no horário local). O Vaticano confirmou a informação, mas ainda não divulgou a causa da morte. Primeiro papa latino-americano e jesuíta da história, Francisco liderou a Igreja Católica por mais de uma década e ficou conhecido por seu esforço em aproximar a Igreja de debates contemporâneos sobre justiça social, racismo, imigração, diversidade de gênero e inclusão da comunidade LGBTQIA+. Sua atuação, no entanto, não foi livre de controvérsias e tensões internas com alas mais conservadoras do clero.
Durante seu pontificado, Francisco denunciou com frequência a escravidão moderna e a exploração de populações marginalizadas. Em 2023, durante visita ao Sudão do Sul e à República Democrática do Congo, condenou o neocolonialismo e alertou sobre a exploração sistemática do continente africano. Em discurso proferido na capital Kinshasa, declarou que a África “não é uma mina a ser explorada nem uma terra a ser saqueada”, posicionando-se contra políticas econômicas internacionais que perpetuam a desigualdade.
O papa também reconheceu o papel histórico da Igreja Católica em processos de violência e exclusão. Na encíclica Fratelli Tutti, de 2020, refletiu sobre o silêncio da instituição diante da escravidão, afirmando: “Às vezes me pergunto por que levou tanto tempo para a Igreja condenar a escravidão e várias formas de violência”. A fala foi considerada um gesto importante por estudiosos da história e da teologia, embora críticos apontem que a reparação institucional ainda é limitada.

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Nos últimos anos, Francisco se reuniu com sobreviventes de tráfico humano e defendeu o combate à escravidão contemporânea como prioridade global. Em dezembro de 2024, no Dia Internacional para a Abolição da Escravidão, escreveu em sua rede social: “A escravidão moderna é um crime de lesa-humanidade. Todos somos reflexo da imagem de Deus e não podemos tolerar o tráfico mais aberrante”.
No campo da diversidade sexual e de gênero, o Papa Francisco adotou uma postura pastoral mais acolhedora do que seus antecessores. Em 2013, ao ser questionado sobre homossexualidade no clero, respondeu: “Se uma pessoa é gay, busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?”. Em 2023, o Vaticano publicou o documento Fiducia Supplicans, autorizando padres a abençoarem casais do mesmo sexo, ainda que sem reconhecimento sacramental. A medida foi vista como um avanço simbólico em direção à inclusão, mas gerou reações negativas entre bispos conservadores, especialmente na África.
Por outro lado, o papa manteve posicionamentos críticos à chamada “ideologia de gênero”. Em março de 2024, classificou o conceito como “um dos perigos mais feios da atualidade”, afirmando que ele “anula as diferenças que tornam a humanidade rica”. A declaração gerou críticas de movimentos feministas e LGBTQIA+, que acusaram o líder católico de reforçar discursos conservadores ao mesmo tempo em que pregava acolhimento.
Ainda assim, Francisco foi o papa que mais nomeou cardeais de países periféricos, ampliando a representatividade dentro da Igreja. Em 2024, nomeou 21 novos cardeais, entre eles líderes religiosos da América Latina, África e Ásia. A descentralização do poder e a tentativa de escuta das realidades locais marcaram seu esforço por uma Igreja mais plural.
Francisco deixa como legado um pontificado que buscou aproximar o catolicismo dos desafios do século XXI. Ao mesmo tempo em que enfrentou resistências internas e limites estruturais, abriu espaço para debates sobre racismo, desigualdade, migração, gênero e sexualidade no seio da Igreja. Sua morte encerra um ciclo de transformações ainda em curso, cujos efeitos deverão ser debatidos nas escolhas do próximo conclave.