Uma operação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou 586 trabalhadores em condições análogas à escravidão em uma usina de etanol em Porto Alegre do Norte (MT). Este é o maior caso do ano em número de pessoas libertadas.
A ação foi deflagrada após um incêndio em alojamentos no dia 20 de julho. De acordo com a auditora fiscal Flora Pereira, coordenadora da operação, a fiscalização encontrou uma situação precária. “Ao chegarmos em Porto Alegre do Norte nos deparamos com uma situação bastante precária, os trabalhadores estavam em condições degradantes, muitos em colchões no chão, sem cama, sem roupa de cama”, explicou Pereira em entrevista ao Brasil de Fato.
Os trabalhadores, contratados pela TAO Construtora para obras na usina da 3tentos, viviam em espaços superlotados, com falta constante de água e energia e condições sanitárias deploráveis. A empresa utilizava água de rio sem tratamento para o abastecimento, segundo o MTE.

O caso ganhou novos desdobramentos quando a fiscalização identificou um sistema clandestino de controle de jornada, o “ponto 2”, usado para não pagar horas extras. A auditoria constatou que, entre fevereiro de 2024 e julho de 2025, a empresa deixou de pagar milhões em verbas trabalhistas. “Nos deparamos com a questão da jornada exaustiva, que foi confirmada com vários pagamentos por fora, no montante superior a R$ 3,9 milhões”, destacou a coordenadora.
Os relatos colhidos pelo MTE revelaram jornadas de até 16 horas diárias, inclusive aos domingos. Um motorista relatou trabalhar das 5h às 21h com apenas uma hora de intervalo. Após o incêndio, a Polícia Militar foi ao local e, segundo relatos, atirou balas de borracha e ameaçou os trabalhadores, que chegaram a ser detidos e perderam documentos. Posteriormente, 17 pessoas foram demitidas por justa causa sem provas de envolvimento no fogo.
A Inspeção do Trabalho determinou o pagamento de R$ 7,7 milhões em indenizações e verbas rescisórias, além da retificação das demissões. Todos os 586 trabalhadores resgatados receberam Seguro-Desemprego. Do total, 96% se autodeclararam negros e apenas três eram mulheres, atuando como cozinheiras. Eles foram recrutados principalmente nos estados do Maranhão, Bahia e Piauí, com acerto verbal de emprego, e tinham que arcar com os custos da viagem, que depois eram descontados de seus salários.
A 3tentos afirmou, em agosto de 2025, que prezava pela dignidade e que práticas violadoras de direitos eram incompatíveis com seus valores. A TAO Construtora informou, também em agosto, que colaborava com a fiscalização e que repudiava qualquer prática análoga à escravidão, ressaltando não haver autuação formal contra a empresa até aquele momento.
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