Mulher mantida em situação análoga à escravidão por 44 anos na BA receberá indenização de R$500 mil

Mulher-em-situacao-analoga-a-escravidao-NP.jpg

De acordo com o Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA), uma mulher de 50 anos, identificada pelo nome fictício de Maria, foi mantida em situação análoga à escravidão por 44 anos na cidade de Porto Seguro, localizada no extremo sul do estado baiano, e vai receber R$500 mil de indenização. As informações foram divulgadas na última segunda-feira (23).

Segundo o ministério, aos seis anos de idade, Maria chegou para trabalhar como doméstica na casa de Heny Peluso Loureiro, patroa que morreu no ano passado, e de seus filhos Joaquim Neri Neto e Maiza Loureiro Nery Santos. “Ela não tinha certidão de nascimento, por isso, não há informações sobre sua origem. Suspeita-se que ela tenha vindo do continente africano e que não falava português quando chegou para trabalhar”, disse o MPT-BA.

De acordo com a instituição, Maria só teve sua certidão de nascimento muitos anos depois, e as informações de filiação eram inverídicas / Foto: Freepik

Igualmente, no fim do mês passado, com a participação da vítima, o MPT-BA e os representantes dos bens da patroa e dos dois filhos chegaram a um acordo: indenização de R$500 mil que deve ser quitada até fevereiro de 2025. O documento foi assinado por todos e homologado pela Justiça do Trabalho; porém, os empregadores não reconheceram culpa.

Maria foi expulsa de casa e teve o útero retirado sem seu consentimento, diz advogada

Em entrevista ao G1, a advogada da vítima, Marta de Barros, disse que, após a morte da mãe, Joaquim Neri começou a tratar Maria com gritos e xingamentos. Segundo ela, a vítima passou a ser vista como um fardo que os filhos de Heny Peluso não queriam carregar. Por isso, a expulsaram de casa.

Além disso, a advogada relatou que Maria teve seu útero retirado sem permissão. Na época, ela tinha um mioma, um tumor benigno que se forma no útero e que acomete cerca de 80% das mulheres em idade fértil, segundo a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). 

Não havia diagnóstico imediato de histerectomia, mas aproveitaram a oportunidade para fazerem uma castração nela“, disse a advogada da mulher.

Ainda de acordo com a advogada, Joaquim Neri também tentou cadastrar Maria para receber benefícios sociais, como o Bolsa Família e o auxílio-doença. Esses pedidos chamaram a atenção da assistência social, levando a equipe do Centro de Referência de Assistência Social (Creas) a visitar a casa de Maria para encaminhar o pedido de inclusão no CadÚnico. Foi a partir dessa visita que a condição de Maria começou a ser revelada, disse o Ministério.

“História igual à de muitas outras brasileiras”, diz o  MPT-BA

De acordo com o Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA), essa história começou de forma semelhante à de muitas outras brasileiras. “Elas, ainda na infância, foram entregues a famílias abastadas para trabalhar como empregadas domésticas e permaneceram por décadas em situação análoga à escravidão”.

Segundo a organização, Maria não estudou, não fez amizades e nem teve relacionamentos amorosos; mas sua sina teve um desfecho positivo. “O acordo vai garantir uma chance de futuro para quem teve seu passado apagado”, afirmou o ministério.

Leia também: Mãe e filho viram réus por submeter idosa a trabalho análogo à escravidão durante 72 anos

Fernanda Amordivino

Fernanda Amordivino

Estudante de jornalismo na UFRB e integrante do Coletivo Angela Davis - Grupo de Pesquisa Ativista sobre Gênero, Raça e Subalternidades. Possui experiência em radiojornalismo e assessoria de comunicação.

Deixe uma resposta

scroll to top