Manifestantes se concentraram nesta quarta-feira (17) em frente à Assembleia da República, em Lisboa, Portugal, em um protesto organizado pela associação Solidariedade Imigrante que reivindicava “documentos para todos”. A manifestação criticou o endurecimento das políticas migratórias do governo português, coincidindo com ações de fiscalização de imigrantes no Alentejo, região sul marcada pela presença significativa de trabalhadores estrangeiros, segundo a RFI.
A agência Lusa informou que a Guarda Nacional Republicana (GNR) inspecionou cerca de 580 pessoas em propriedades agrícolas de Odemira, distrito de Beja. Dois homens, de 26 e 27 anos, foram detidos por estarem em situação irregular no país.
Timóteo Macedo, presidente da Solidariedade Imigrante, afirmou que as operações não ocorreram por acaso. “É um clima de medo instaurado por políticas que se alinham com a extrema direita, numa verdadeira caça ao imigrante. Sabendo que haveria uma grande manifestação em frente ao Parlamento, essas ações parecem ter sido pensadas para impedir que muitos imigrantes do Alentejo chegassem a Lisboa. Não é coincidência. É proposital”, disse ele a RFI.
Brasileiros, que representam cerca de 15% da população imigrante em Portugal, têm sido alvo de discriminação e xenofobia. Dados da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) mostram que, entre 2018 e 2021, as denúncias formais contra brasileiros cresceram 142%, somando 109 queixas. Relatos incluem desde agressões verbais e físicas até dificuldades de acesso a emprego e moradia.
Segundo relatório de 2022 da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância (ECRI), 55% dos brasileiros já sofreram algum tipo de discriminação, índice superior ao de outras comunidades lusófonas, como os africanos (33%). O estudo Migramyths, da Casa do Brasil de Lisboa, aponta que mulheres brasileiras enfrentam dupla discriminação por gênero e nacionalidade, com 56,8% relatando xenofobia e 27,8% preconceito linguístico.

Entre 2023 e 2024, o número de brasileiros impedidos de embarcar para Portugal aumentou 700%, passando de 179 para 1.470 pessoas, segundo registros da imigração citados pela imprensa portuguesa. Especialistas atribuem o crescimento a uma seletividade maior nas políticas migratórias.
“Vivemos um estado de terror, especialmente por conta das políticas públicas voltadas à imigração. Há ameaça de que o governo ignore decisões do Tribunal Constitucional sobre alterações na lei”, disse Macedo ao RFI, que elogiou a mobilização: “Talvez essa tenha sido a maior concentração de imigrantes em frente ao Parlamento. Recebemos apoio de muitos portugueses solidários à nossa luta”.
Ele ainda criticou a rigidez das normas: “É dramático receber notificações com prazo de 20 dias para deixar o país, principalmente quando há pessoas aguardando anos por documentos. O Estado português está agindo de forma ilegal”.
A nova Lei da Imigração foi aprovada em 16 de julho, mas alguns artigos foram rejeitados pelo Tribunal Constitucional em 8 de agosto, especialmente os que limitavam o reagrupamento familiar. O governo terá de revisar a legislação enquanto os imigrantes enfrentam dificuldades para viver e trabalhar legalmente em Portugal.
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