Mãe Meninazinha de Oxum lança projeto de pesquisa com aula inaugural em universidade do Rio de Janeiro

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O projeto de pesquisa “Acervo Nosso Sagrado: pesquisa, identificação, reconhecimento e gestão participativa de acervo religioso afro-brasileiro”, liderado por Mãe Meninazinha de Oxum, será lançado oficialmente na próxima segunda-feira (31) na sede da UNIRIO, com uma aula inaugural da iyalorixá do Ilê Omolu Oxum, localizado em São João de Meriti (RJ).

O projeto surgiu da parceria entre o Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado, a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e o lançamento contará com a presença das lideranças religiosas e dos parceiros
deste projeto.

Mãe Meninazinha de Oxum, iyalorixá do Ilê Omolu Oxum /Foto: Alex Ferro

O professor Dr. José da Costa Filho, reitor da UNIRIO, celebra este trabalho: a UNIRIO está extremamente orgulhosa de fazer parte desta pesquisa que irá contribuir para o tombamento integral do Acervo Nosso
Sagrado, que se aporta como fundamental e necessária reparação histórica junto aos povos de terreiros.

De acordo com o Plano de Trabalho elaborado pela UNIRIO em 2024, o objetivo do projeto é desenvolver pesquisa específica sobre o Acervo Nosso Sagrado, em parte tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em 1938 (processo de tombamento 035-T-38), que se encontra no Museu da República.

A pesquisa acadêmica, visa à elaboração de um dossiê técnico que forneça subsídios ao Iphan para instrução do processo de rerratificação do bem (processo SEI 01500.900458/2017-49), bem como
ações de preservação, pesquisa, documentação, comunicação, divulgação valorização, em articulação com o Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado, previstas para realizadas até o ano de 2026.

O Acervo Nosso Sagrado é constituído de 519 bens sagrados (sendo 126 deles tombados pelo Iphan em 1938) e tem imensa relevância para os religiosos de matrizes africanas. Formado a partir de batidas policiais em terreiros de Candomblé e Umbanda, do Rio de Janeiro, nas primeiras seis décadas da República (1890 – 1946), as incursões eram instruídas por ordens de cunho racista, que criminalizavam essas práticas religiosas, vinculando-as ao curandeirismo, ao charlatanismo e ao baixo espiritismo e, com base nessas vinculações, interrompiam cerimônias religiosas, prendiam seus praticantes e confiscavam seus bens como “provas do crime”.

Depois de uma intensa campanha das comunidades tradicionais de terreiros liderada pela iyalorixá do Ilê Omolu Oxum, Mãe Meninazinha de Oxum, o Nosso Sagrado (ainda sob o nome de “Coleção Museu da Magia Negra”) foi transferido para o Museu da República, em 21 de setembro de 2020, em caráter de reparação e por solicitação do Grupo de Gestão Compartilhada. Em março de 2023, finalmente o nome da coleção foi alterado no livro de tombo do Iphan, a pedido das lideranças religiosas.

Na época, o presidente do Iphan, Leonardo Grass, afirmou que a retificação do nome no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico se tratava de uma reparação histórica pois a terminologia era bem preconceituosa e desprovida de sentido, porque é um termo pejorativo para designar e fazer referências às matrizes africanas religiosas – conclui Leonardo Grass. Vale ressaltar que cada etapa do trabalho realizado pelo Grupo de Gestão Compartilhada, opera para expandir conhecimentos sobre as práticas religiosas de matrizes africanas, afirmando o direito à memória, à cultura e à vida, sendo tratados em sentido contrário ao histórico de manuseios insensíveis que sofreram na polícia.

De acordo com o coordenador acadêmico do projeto, professor Dr. Mario Chagas, todas as ações deste projeto operam em torno do Acervo Nosso Sagrado na direção de construir uma consciência social antirracista e democrática. Envolvem o povo de Axé, alunos, professores, pesquisadores e profissionais da área do patrimônio cultural em geral. Mãe Meninazinha de Oxum costuma dizer que o Nosso Sagrado não devia ser um acervo, mas, se é, que seja um instrumento pedagógico antirracista. A constituição desse acervo é atravessada pelo racismo, especialmente aquele que se manifesta desqualificando expressões culturais não brancas, criminalizando os bens das religiosidades afro-brasileiras – conclui Mario Chagas.

Considerado como uma nova etapa da reparação histórica sobre este acervo, o projeto “Acervo Nosso Sagrado: pesquisa, identificação, reconhecimento e gestão participativa de acervo religioso afro-brasileiro” vai proporcionar uma correta leitura sobre cada um dos bens sagrados, a partir da perspectiva dos conhecimentos das lideranças religiosas, corrigindo os nomes que muitas vezes eram designados de maneira racista e preconceituosa pelos agentes policiais, quando foram apreendidos. Este novo inventário ficará disponível com acesso universal em uma plataforma digital oficial do Ministério da Cultura.

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