Gerente da Zara é condenado por crime de racismo após barrar entrada de delegada em loja de Fortaleza

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Na última sexta-feira (30), o Tribunal de Justiça do Ceará condenou um ex-gerente de uma loja da Zara por racismo. O caso aconteceu em setembro de 2021, quando o funcionário impediu a entrada da delegada Ana Paula Barroso, que é negra, em uma das lojas da rede, localizada em um shopping da capital cearense.

Bruno Filipe Simões Antônio, que à época ocupava o cargo de gerente, foi condenado a um ano, um mês e 15 dias de prisão. Mesmo diante da situação, o juiz Francisco das Chagas Gomes optou por substituir a pena de reclusão por prestação de serviços comunitários, além do cumprimento de medidas restritivas de liberdade nos fins de semana. A defesa de Bruno ainda pode recorrer da decisão.

A loja onde o caso aconteceu está localizada em Fortaleza /Foto: Divulgação \ Zara

Segundo o relato de Ana Paula Barroso, ao entrar na loja, ela foi imediatamente abordada por um funcionário que, de forma brusca, ordenou que ela deixasse o local por “questões de segurança do shopping”. A delegada, sentindo-se constrangida, saiu do estabelecimento e procurou um segurança para formalizar a queixa. Posteriormente, acompanhada pelo chefe de segurança, voltou à loja para buscar esclarecimentos.

Ao questionar o gerente sobre o motivo da abordagem, Ana Paula perguntou se estava sendo tratada dessa forma por ser uma mulher negra ou por estar com roupas simples. O gerente, Bruno Filipe, negou qualquer discriminação e afirmou que a ação se deu por ela estar sem máscara e consumindo um sorvete, o que contrariava as regras sanitárias em vigor devido à pandemia de Covid-19.

Porém, as imagens de câmeras de segurança mostraram uma contradição. Nas imagens, é possível ver que outros clientes, também sem máscara, não foram submetidos ao mesmo rigor. Uma dessas consumidoras fez compras e permaneceu na loja sem qualquer intervenção dos funcionários, o que reforçou as suspeitas de discriminação racial no caso de Ana Paula.

Testemunhas e funcionários da Zara confirmaram que a orientação dada pela loja era apenas para informar os clientes sobre o uso de máscaras e, se necessário, encaminhá-los à praça de alimentação para consumir alimentos. Se houvesse recusa, a medida correta seria acionar a administração do shopping, e não barrar a entrada do cliente.

A advogada que denunciou a situação e que deixou o estabelecimento após ordens do funcionário / Foto: PCCE/Divulgação

Decisão judicial

Embora a delegada estivesse de fato desrespeitando a regra do uso de máscara, o juiz ressaltou que isso não justificava a ação discriminatória do ex-gerente. O magistrado destacou que Bruno Filipe tratou a cliente de maneira desigual em comparação com outros consumidores, o que configurou a prática de racismo.

A condenação do ex-gerente teve como base a Lei nº 7.716/1989, que tipifica os crimes de discriminação racial no Brasil. De acordo com o artigo 5º da referida lei, é considerado crime “recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador”. A legislação prevê punição de reclusão de um a três anos para quem cometer tal prática.

A aplicação da Lei de Crimes Raciais tem sido cada vez mais debatida em episódios de discriminação que ocorrem em espaços públicos e privados no Brasil.

Segundo o advogado e militante do Movimento Negro Unificado (MNU), Erik Moraes, a legislação é clara em sua abrangência e impacto. “As principais leis para o combate à discriminação racial no Brasil afetam todos os ambientes, sejam comerciais, educacionais ou sociais. Entre elas, destaca-se a Lei nº 7.716/1989, conhecida como Lei de Crimes Raciais, e o Código Penal, que prevê a injúria racial”, explica Erik Moares.

Ele ainda destaca que o artigo 5º da Lei nº 7.716/1989 trata especificamente da discriminação em estabelecimentos comerciais. “Negar acesso ou atendimento está claramente previsto como crime na lei. Além disso, esses estabelecimentos funcionam mediante licenças estaduais e municipais, o que também permite a imposição de sanções administrativas, como multas“, afirma o advogado.

Além das penalidades criminais, o advogado ressalta que as vítimas podem buscar reparação na justiça civil. “A pessoa que se sentir discriminada pode acionar tanto a justiça criminal quanto a cível para obter reparações de danos morais e materiais. É fundamental que a vítima tenha provas, como vídeos, fotos ou testemunhas, para que essas situações sejam devidamente punidas conforme prevê a lei brasileira“, conclui Erik.

A produção do Notícia Preta tentou entrar em contato com a rede Zara para pedir esclarecimentos sobre a situação, mas até o fechamento desta matéria, não tivemos resposta. O espaço permanece aberto. 

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Lucas Santos

Lucas Santos

Lucas Santos é estudante de comunicação social, com habilitação em Rádio e TV pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Ingressou na TV UFMA em novembro de 2022, trabalhando na produção de pautas jornalísticas e reportagens. Em junho de 2023, começou a estagiar na TV CIDADE, afiliada da RECORD. Atualmente, Lucas continua trabalhando com jornalismo diário na TV UFMA, exercendo a função de produtor e repórter. Além disso, faz trabalhos com fotografia, gerenciamento de redes sociais e redação.

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