”Perdoar pressupõe punição; do contrário, não há perdão, senão condescendência. A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente”, diz as últimas linhas de uma carta escrita por Mirtes Renata, mãe do garoto Miguel, que morreu após cair do 9° andar de um prédio de luxo no centro do Recife, em Pernambuco.
Na mensagem, Mirtes conta que a primeira-dama da Prefeitura de Tamandaré, Sari Gaspar Corte Real, só se preocupou em prestar satisfação à imprensa. No dia 4 outubro tem eleições municipais e o atual prefeito, Sergio Hacker, concorrerá à reeleição.
”Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição”, diz a carta escrita com auxílio do advogado dela, Rodrigo Almendra
Sari Gaspar Corte Real foi acusada de homicídio culposo, pagou uma fiança de R$ 20 mil e responde em liberdade. No último domingo, o Portal Notícia Preta publicou em primeira mão que a patroa de Mirtes está cadastrada no Auxílio Emergencial de R$ 600.
Confira a carta na íntegra:
Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição.
Eu não tenho rancor. Tenho saudade do meu filho. O sentido da vida de quem é mãe passa pelo cheiro do cabelo do filho ao acordar, pelo sorriso nas suas brincadeiras, pelo “mamãe” quando precisa do colo e do abrigo de quem o trouxe ao mundo. Uma mãe, sem seu filho, sofre uma crise, não apenas de identidade, como também de existência. Quem sou eu sem Miguel? Ela tirou de mim o meu neguinho, minha vida, por quem eu trabalhava e acordava todos os dias.
Quando eu grito que quero justiça, isso significa que eu preciso que alguém assuma a minha dor, lute minha luta, seja o destilado da cólera que eu não quero e nem posso ser. Eu não tenho forças neste momento, não tenho chão. Não tenho vida!
Após poucos dias é desumano cobrar perdão de uma mãe que perdeu o filho dessa forma tão desprezível. Afinal, sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser “filho da empregada”.
Perdoar pressupõe punição; do contrário, não há perdão, senão condescendência. A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente.
Mirtes, mãe de Miguel.