10% das mulheres no mundo, em idade reprodutiva, sofrem da doença e cerca de 30% a 50% delas podem ser inférteis (ASRM)
“Desde a adolescência, enfrentei dores intensas, mas só aos 35 anos descobri que tinha endometriose. O diagnóstico tardio resultou em duas cirurgias, incluindo a retirada do útero e parte do intestino. Embora as dores tenham cessado, precisei aprender que hoje não tenho a escolha de engravidar. Caso decida ser mãe, precisarei buscar alternativas “, conta Livia Furlan – pseudônimo para a nutricionista de 46 anos, que prefere não se identificar, ao relatar sua experiência.
Assim como Lívia, cerca de 190 milhões de mulheres em idade reprodutiva (de 15 a 49 anos) em todo o mundo sofrem com a doença, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Caracterizada pelo crescimento de tecido fora do útero, frequentemente se manifesta de maneira silenciosa, afetando principalmente a região pélvica. Em muitos casos, o diagnóstico é tardio, sendo realizado apenas durante investigações relacionadas à dificuldade para engravidar.

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A condição é uma preocupação na saúde feminina, tanto pela dor incapacitante que pode causar, quanto pela associação com infertilidade. Tanto que existem alguns projetos de lei, como o 1069/23, que determina que o serviço de saúde público tenha como diretriz a organização de atendimento especializado, com acompanhamento multidisciplinar para mulheres com essa condição.
“Quando o endométrio cresce fora do útero pode causar processo inflamatório, aderências, obstrução das trompas e alterações imunológicas que dificultam a gravidez. A detecção precoce é essencial para minimizar esses danos e preservar a fertilidade”, diz Dr. Manoel Orlando Gonçalves, coordenador do diagnóstico por imagem da pelve feminina do Alta Diagnósticos.
A relação entre a endometriose e a infertilidade é complexa, entre 30% e 50% das mulheres com a doença enfrentam dificuldades para engravidar, segundo dados da American Society for Reproductive Medicine (ASRM).3 Isso ocorre devido a vários fatores, tais como:
- Alterações anatômicas nas tubas (que podem alterar a sua capacidade de carregar o óvulo ou mesmo obstrui-las) ou nos ovários (principalmente quando há grandes cistos de endometriose dentro deles, reduzindo a quantidade e a qualidade dos futuros óvulos);
- Distúrbios imunológicos: há alguns anos se descobriu que a doença, independentemente de onde estiver na pelve, pode criar um ambiente uterino hostil para a implantação do embrião. Os primeiros sinais da doença geralmente aparecem na adolescência, mas o diagnóstico costuma ser realizado somente na terceira década de vida das mulheres. Os sintomas mais frequentes incluem dor menstrual intensa (dismenorreia), dor lombar no período pré-menstrual e menstrual, alterações intestinais, urinárias e dor durante a relação sexual (dispareunia profunda).
Entre 10 e 15% das mulheres não apresentarão sintomas evidentes, principalmente quando estiverem usando algum tipo de anticoncepcional.
“A endometriose pode prejudicar a função ovariana e tubária, agravando ainda mais os problemas de fertilidade. Hoje, uma série de exames detectam lesões e determinam a extensão da doença, possibilitando um tratamento mais eficaz”, explica a Dra. Cassia Domit, médica radiologista especializada em exames diagnósticos da infertilidade feminina no Alta Diagnósticos.
Exames para o diagnóstico
Inicialmente a suspeita de endometriose pode ser feita pelas queixas e/ou pelo exame (toque vaginal) realizado pelo ginecologista. Para confirmação e estadiamento (sistema utilizado para classificar a gravidade da doença com base na sua extensão e localização) há uma série de exames especializados que devem ser realizados por especialistas, já que é uma doença muito complexa.
- Ultrassom Transvaginal e Abdominal Especializado com preparo intestinal: permite identificar mais de 90% das lesões por endometriose, sendo o melhor método para lesões intestinais.
- Ressonância Magnética da Pelve e Abdome Especializada com preparo intestinal: oferece imagens detalhadas que possibilitam o diagnóstico da doença em mais de 90% dos casos, sendo o método preferencial quando se suspeita de endometriose em lugares atípicos, como por exemplo o diafragma.
- Histerossalpingografia: permite avaliar com detalhe as tubas uterinas e a sua permeabilidade. Nos casos mais complexos pode ser necessária a utilização de mais de um desses exames para o entendimento completo da doença e, portanto, a definição da estratégia terapêutica mais adequada para cada paciente.
“O método tradicionalmente utilizado para o diagnóstico da endometriose é a cirurgia diagnóstica (videolaparoscopia), no entanto, onde há centros avançados de Imagem esse procedimento invasivo não é mais necessário para detectar a doença”, diz o Dr. Manoel Orlando.
Tratamento da endometriose e infertilidade: abordagens personalizadas
“O tratamento da endometriose varia de acordo com a gravidade da doença, as queixas e os objetivos reprodutivos da paciente”, explica Dr. Manoel. Entre as opções estão:
- Terapia Hormonal: gestrinona e progesterona isolada ou combinada por via oral ou por Dispositivo Intrauterino (DIU) são as formas mais utilizadas para ajudar a controlar os sintomas, como cólicas intensas, mas não tratam a doença e não aumentam a chance de gravidez. Análogos do GnRH foram muito utilizados, mas atualmente seu uso é muito limitado devido aos efeitos colaterais (semelhantes à menopausa) e à constatação de que não tinham vantagem evidente em relação aos demais bloqueios.
- Cirurgia Laparoscópica: em casos mais avançados, quando os quadros de dor são de difícil controle ou quando se supõem que a endometriose é a causa da infertilidade, a remoção das lesões através de cirurgia pode ser necessária. Esse procedimento ajuda a restaurar a anatomia pélvica, diminui ou elimina o quadro doloroso e aumenta as chances de concepção natural ou assistida.
- Técnicas de Reprodução Assistida: mulheres com endometriose podem se beneficiar de tratamentos como a fertilização in vitro (FIV), que pode contornar as obstruções nas trompas ou a baixa qualidade dos óvulos, aumentando a possibilidade de gravidez.
O diagnóstico precoce da endometriose é essencial para reduzir os impactos ao sistema reprodutivo e aumentar as chances de sucesso no tratamento. Com o avanço do diagnóstico por imagem e o progresso nos tratamentos é possível entender o estágio da doença e tomar as medidas necessárias para melhorar a qualidade de vida das pacientes e aumentar a chance de gravidez, para as que desejarem.