O dramaturgo Adalberto Neto, que já ganhou alguns prêmios, dentre eles o Prêmio Shell de Teatro na categoria dramaturgia com o espetáculo “Oboró – Masculinidades Negras” em 2021, assina agora o roteiro do musical “O Mágico de Oz”, que estreia em São Paulo no dia 20 de julho com Duda Pimenta, uma protagonista negra, no papel de Dorothy.
Com o novo projeto prestes a estrear, o dramaturgo falou com o Notícia Preta um pouco sobre sua relação com a dramaturgia e com a arte que transforma e rompe com preconceitos, sobre o sucesso dos seus vídeos nas redes sociais que abordam a temática racial com humor, e também detalhes e expectativas sobre a montagem do clássico infanto-juvenil.
Formado em jornalismo, Adalberto trabalhou na área mas conta que seu sonho mesmo, estava em outra forma de contar histórias. Na arte. O dramaturgo conta que sempre escreveu, desde criança, de música e poesia, até textos e cenas mais curtas. “Conforme eu ia avançando, eu aprendia, eu ia me descobrindo um apaixonado pelas letras”.
E essa paixão levou Adalberto a ser um dramaturgo premiado, e o levou a assinar o roteiro de uma grande montagem como o “O Mágico de Oz”. O autor conta como se sente em poder ser parte dessa adaptação da história escrita por L. Frank Baum em 1900.
“Para mim é uma grande honra pois é um clássico infantil que fez parte da minha infância. Eu adorava assistir sempre que passava, então como autor e roteirista, é muito especial. É muito importante contar nossas histórias, mas também é importante trazer os clássicos para mais perto da gente. E esse que tem uma Dorothy que será interpretado por uma atriz preta, é muito especial para mim”, diz.
O dramaturgo afirma que nesse roteiro, ele não fez modificações para introduzir a questão racial de maneira explícita, mas pontuou certos detalhes que fez questão de dar um outro olhar.
“Tem um momento em que a vizinha briga com o cachorro da Dorothy, e a menina diz: ‘Uma mulher que gosta de animais não vai fazer mal para outro animal’. E ai passando a mão por seu corpo ela fala ‘O problema dela não deve ser com o totó, o problema dela é comigo’, e ai para quem sabe ler, um pingo é letra né”, conta Adalberto, que também tirou termos etaristas e que remetem a violência.
O autor acredita que para além do racismo, ele também tem um compromisso com outros grupos discriminados. “Eu faço parte de grupo minoritário mas eu não vou lutar apenas contra o racismo e contra a homofobia, por eu ser um homem gay preto. Eu acho que a gente tem que ter um olhar carinhoso para os outros grupos minoritários”.
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E ele que também assina o roteiro de outro musical, a ‘A Fabulosa Fábrica de Música’, diz que nesse fez mais toques na questão racial. “É uma história universal, mas eu coloquei armadilhas no roteiro onde certos personagens tem que ser pretos, o que é bem proposital”, conta o dramaturgo que vê na arte uma grande possibilidade de luta.
“O papel da arte é de transgredir com essa lógica que muitas vezes vem cheia de erros, de problemas. Se a gente reproduz só o mundo atual nas novelas, nos filmes, nos teatros, a gente vai manter essa lógica toda errada do preto no lugar de subserviência, como bandido, e os brancos nos lugares de privilégio”, explica Adalberto, que continua:
“Então a gente tem que recriar realidades até para a gente mostrar que existem outros caminhos e que eles são mais democráticos, tem mais isonomia, mais diversidade e inclusivos. E a gente normatizar, o que precisa ser normatizado. E condenar o que precisa ser condenado, mas que foi normatizado”.
Com a estreia de “O Mágico de Oz” cada vez mais perto, o dramaturgo afirma que as expectativas são as melhores possíveis. “É um clássico, que todo mundo gosta. Então os adultos vão para ver, e levar o filho ou o sobrinho, ou sozinhos mesmo para matar a saudade da história. E as crianças vão se encantar. Eu estou muito ansioso, muito feliz e eu acho que vai ser incrível”.
O musical chega ao Teatro Procópio Ferreira, e São Paulo, com uma temporada do dia 20 ao dia 30 de julho.
E conciliando o trabalho com o universo dos palcos, Adalberto também é conhecido por seus famosos vídeos de humor, em que aparece com o rosto pintado de branco em tom de crítica, interpretando uma pessoa branca, e abordando questões raciais de forma bem humorada.
Esses vídeos, inclusive, ocupam um espaço especial nas redes do Notícia Preta, que toda sexta-feira posta o conteúdo. Essa criação, segundo ele surgiu durante a pandemia, e afirma que essa também é uma forma de praticar a arte da dramaturgia e somar com os ensinamentos do jornalismo.
“Eu acho que ali eu estou praticando, porque ali eu trabalho minha criatividade, então eu mantenho a minha mente trabalhando. E como esses vídeos eu não penso muito, eu decido o que vai ser na hora, eu trabalho essa coisa do agora, que tem muito no jornalismo. Então a prática no jornalismo que me fez ser rápido na dramaturgia”, conta.
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