A religião pautando os corpos das mulheres

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Por: Jéssica Silva de Oliveira
Advogada Civilista

Desde os primórdios algumas religiões exercem um papel doutrinador sobre os corpos das mulheres, interferindo, por via da influência sobre o Estado, nas liberdades de escolha da mulher. Exemplo disso é a dificuldade no avanço de pautas feministas, como a legalização do aborto, nas legislações mundo afora.

Países historicamente ligados à Igreja Católica, como a Polônia, têm maior dificuldade de permitir o aborto, em qualquer circunstância, em razão da forte influência religiosa no Estado. No Brasil, em tese, um país laico, seguimos alinhados com políticas de países ultra conservadores em relação aos direitos reprodutivos das mulheres, como Irã, Afeganistão e Síria.

O avanço de pautas conservadoras no governo está intimamente ligado ao crescimento da bancada religiosa e à ausência de representatividade feminina no Congresso. Estamos falando de uma maioria esmagadora de mais de 80% de cadeiras ocupadas por homens ultra conservadores, legislando sobre os corpos das mulheres.

Diferentemente do que propagam os mal intencionados de plantão, a luta por direitos das mulheres é, antes de tudo, uma luta por direitos humanos. É sobre o livre exercício da sexualidade e da reprodução, sem interferência do Estado, com exceção para assegurar o acesso à informações e meios de satisfação de tais direitos, ou seja, políticas públicas que visem a efetivação dos direitos das mulheres.

Outro alvo constante de ataques da bancada religiosa é a implementação de educação sexual para crianças e adolescentes. Em um país que, a cada hora, três crianças ou adolescentes são abusados sexualmente, sendo meninas as principais vítimas, se faz urgente o diálogo sobre sexualidade nas escolas e em casa, respeitando, por óbvio, a abordagem apropriada para cada faixa etária.

Estamos falando de milhares de crianças e adolescentes vítimas de situações de abuso que poderiam ser evitados, caso o país adotasse políticas públicas mais efetivas de prevenção ao abuso e à exploração infantil, e abandonasse dogmas religiosos que só contribuem para o estado de vulnerabilidade dessas crianças e adolescentes.

Só mesmo nessa sociedade distópica em que vivemos, uma menina de apenas 10 anos, vítima de abuso sexual, é, não apenas, ameaçada por interromper uma gestação provocada por reiterados abusos ao longo de 4 anos, como acusada de ser conivente com um ato tão vil como este.

A experiência social e política de ser mulher em um país que é condescendente com a cultura do estupro, por si só, deveria ter atenção prioritária no campo dos direitos humanos, sem desconsiderar, claro, os diferentes recortes que as atravessam, como raça, classe, orientação sexual
e identidade de gênero.

Qualquer mulher vítima de violência sexual necessita, no mínimo, da empatia de todos para com o trauma que carregará consigo pelo resto da vida. Agora imagine uma criança.

Jéssica Silva de Oliveira – Advogada
Contato: https://linktr.ee/silvadeoliveira.adv

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