Uma pesquisa realizada pelo Instituto Mercado Mineiro e divulgada esta semana mostrou que o marmitex, ou a quentinha, como é popularmente conhecida, teve uma variação de 324% no preço, podendo chegar a R$ 46,70, em Belo Horizonte (MG) dependendo da região. Além disso, o estudo mostra também que o prato feito, famoso PF, pode chegar a R$ 48,00, um reajuste de 3%, em relação a fevereiro deste ano.
O aumento da marmita fez com que trabalhadores e trabalhadoras voltassem a levar comida de casa para o trabalho, como é o caso do doutor e professor de geografia, Wallace Carvalho que revela o motivo de ter feito essa mudança. “O almoço aí fora ficou muito caro. Aliado a isso, estou pensando na minha reeducação alimentar também. Antes, a marmita tinha um tom pejorativo, atualmente, não, é o contrário. É economia”, afirma.
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Carvalho lembra ainda que os valores aumentaram no pós-pandemia. “Eu pagava R$ 13, R$ 14 o PF, onde eu almoçava, antes da pandemia. Em se tratando de Savassi [bairro da região Sul de BH], era um preço acessível. Na Savassi você tem almoço muito mais alto que isso e, atualmente, o mais barato gira em torno dos R$ 19. Eu cheguei a comprar os preços. Pra mim fica mais em conta. Sem sombra de dúvidas que estou economizando”, pontua.
Outras áreas também tiveram mudança de hábitos, não só a alimentação. Carvalho ressalta que o preço dos combustíveis também o fez mudar a estratégia. “Para economizar em outras áreas, no que tange o carro, por exemplo, estou colocando etanol porque está mais acessível. Comparando, o etanol está mais competitivo. Mudei o hábito e, nas últimas semanas, venho colocando só etanol”, revela.
Segundo a economista e doutoranda em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo, Priscila Soares dos Santos, o aumento do preço da alimentação depende de uma série de fatores. “A alimentação fora de casa está mais cara devido ao aumento do preço dos alimentos, que envolvem tanto a demanda por nossas commodities no comércio internacional, quanto o preço do combustível e a desvalorização do Real”, pontua.
Ela ressalta ainda que a promoção de políticas públicas para controle dos preços seria uma forma de amenizar a situação, uma vez que o mercado externo está em um momento tenso, com o conflito entre Rússia e Ucrânia. “Para que a alimentação fora de casa volte a ser uma opção acessível, é preciso uma combinação de fatores, aliando tanto o cenário externo favorável, quanto a atuação governamental para promover ações estratégicas internas e um acesso mais equitativo à alimentação de qualidade”, afirma.
A economista lembra que a inflação dos alimentos impacta a vida de todos, seja direta ou indiretamente. No entanto, os mais vulneráveis são mais atingidos com a alta dos preços. “É certo que é a população mais pobre, que destina grande parte de sua renda para o consumo, que mais sofre. É complicado porque essa parcela da população têm uma parte cada vez maior de sua renda comprometida com a alimentação, sendo que os demais gastos fixos ainda precisam ser cobertos”, enfatiza.
Ela lembra ainda que a insegurança alimentar é uma constante na vida das pessoas em vulnerabilidade social e econômica. “A consequência disso para a população mais pobre é a substituição dos alimentos de maior qualidade pelos de menor valor nutricional, o que pode impactar na saúde e no desenvolvimento dessas pessoas, além de aumentar os níveis de insegurança alimentar no país. É urgente uma atenção dos gestores públicos para essa questão”, comenta.
Cesta básica
Um levantamento realizado pela Fundação de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis (Ipead) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), revelou que a cesta básica em Belo Horizonte aumentou 30%, chegando a R$ 695,41, o maior valor desde o início da série histórica, em 1994.
O levantamento mostrou ainda que os reajustes dos combustíveis, gás de cozinha e a inflação sobre os alimentos puxaram a alta na cesta básica. Tomate (29%), banana (23%) e óleo de soja (18%) são os produtos que mais subiram. No mesmo período de 2021, a cesta básica custava R$ 552,32, um reajuste de R$ 143,09 em cada cesta.
“É lamentável que após tantos avanços envolvendo controle inflacionário e políticas sociais no Brasil, estejamos passando por um retrocesso no que diz respeito ao acesso à alimentação de forma adequada por grande parte da população. A alta no preço dos alimentos que compõem a cesta básica dos brasileiros compromete muito a qualidade de vida da população mais pobre e isso deve ser uma preocupação primordial dos tomadores de decisões na esfera pública”, afirma Priscila Soares.Ela lembra também que as políticas públicas precisam ser efetivas e depende exclusivamente do Poder Público para que sejam executadas, levando mais acesso à alimentação saudável e dignidade aos necessitados. “Particularmente, não acredito em dicas e sugestões de como essa parcela da população pode passar por esse momento, porque não creio que essa responsabilidade deve ser dessas pessoas. A garantia de acesso à alimentação é um direito constitucional e não deve ser somente uma responsabilidade individual. As forças públicas têm poder de atuação sobre esse cenário e cabe a elas cumprir com esses direitos da população”, finaliza.