Tuiuti falará de Xica Manicongo: “Oportunidade de falar da transcestralidade”, diz carnavalesco

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Terça-feira de carnaval (04), a Paraíso do Tuiuti desfilará na Marquês de Sapucaí com um enredo que promete emocionar e conscientizar. A escola vai contar a história de Xica Manicongo, uma figura histórica que representa a luta pela visibilidade e respeito às identidades trans e às práticas religiosas ancestrais. O carnavalesco Jack Vasconcelos revelou detalhes sobre o processo de criação do enredo, que une pesquisa histórica, espiritualidade e um profundo respeito à ancestralidade.

Para ele o enredo é uma oportunidade para falar sobre a “transcestralidade”, um conceito que une a ancestralidade às experiências transgênero. “É uma oportunidade de falar da transcestralidade, dessa importância. Se fala muito da ancestralidade hoje em dia, dos fundamentos ancestrais de várias questões, inclusive raciais. Mas a gente está falando de uma figura que traz essa importância religiosa da figura LGBT e das pessoas trans através da história do mundo”, explicou.

A escola vai contar a história de Xica Manicongo, uma figura que representa a luta pela visibilidade e respeito às identidades trans – Foto: Rio Carnaval

“Tem gente olhando pra gente, né? Além do carnavalesco, além da pessoa que trabalha, tem alguém olhando pro ser humano. Porque, pra mim, a escolha desse tema fala direto com a gente, fala direto para o ser humano”, afirmou o carnavalesco.

Quem foi Xica Manicongo?

Xica Manicongo é uma personagem histórica pouco documentada, mas de grande relevância para a cultura afro-brasileira e para a comunidade LGBTQIA+. O carnavalesco explicou que a pesquisa sobre ela foi baseada em estudos, que trouxe à luz a existência de Francisco Manicongo, posteriormente rebatizado como Xica Manicongo.

“A gente não tem um registro muito preciso de detalhes da existência da Xica. Sabemos, através de uma pesquisa importante do professor Luiz Mott, que ela veio da região do Congo e Angola, era do grupo quimbanda e usava uma saia amarrada na frente, o que compunha uma figura mais feminina. Isso pode ter gerado confusão na época”, contou. Ele ressaltou que Xica foi trazida ao Brasil como pessoa escravizada, perdeu seu nome africano e foi batizada como Francisco, sendo forçada a assumir uma figura masculinizada.

“Ela foi denunciada e acusada de sodomia e bruxaria pela Santa Inquisição na Bahia, porque tentou praticar aqui seus conceitos religiosos”, explicou. O carnavalesco destacou que a história de Xica serve como espelho para a geração atual, reforçando a luta por visibilidade e respeito. “Ela serve de espelho para a geração de hoje, mostrando essa luta por visibilidade com respeito. Não tem outra palavra: respeito. Respeito pelo que você é, pelo que acredita, pelo que pratica, como cidadão ou cidadã, independente do que seja”, afirmou.

O processo de pesquisa: da academia à espiritualidade

O carnavalesco revelou que o processo de pesquisa foi desafiador, já que há poucos registros históricos sobre Xica Manicongo. Ele contou que teve acesso a textos de pesquisadores trans, que enriqueceram sua compreensão sobre a personagem. “Tive acesso a muitos textos de uma geração de pesquisadores trans que escreveram sobre a Xica. Esse material é precioso para mim, porque é o filtro delas falando do que é importante para elas”, disse.

No entanto, ele ressaltou que a pesquisa bibliográfica não foi suficiente para preencher todas as lacunas da história. “Eu achava que o enredo estava muito duro, faltava algo. Tinha muitas lacunas que nenhuma pesquisa estava me dando. O que eu conto para vocês é uma história vista de um drone, superficial. Quando você mergulha nesse universo, precisa de uma ambientação mais profunda”, explicou.

Foi então que o carnavalesco decidiu buscar orientação espiritual, já que Xica praticava quimbanda, uma religião de matriz africana. “Conheci alguém da quimbanda que me orientou. A pesquisa fria foi preenchida pela boca da própria Xica Manicongo. Tem coisas no enredo que não estão em livro nenhum, e eu tive o privilégio de ouvir da boca do próprio espírito”, revelou.

Um enredo que une história, espiritualidade e resistência

O desfile da Paraíso do Tuiuti promete ser uma celebração da resistência e da diversidade, trazendo à tona a história de Xica Manicongo como símbolo de luta e respeito. “Esse enredo tem uma construção não só de fontes bibliográficas, mas também de experiências. Ele fala da minha comunidade, de uma parte extremamente importante historicamente nas lutas que beneficiaram toda a comunidade”, finalizou o carnavalesco.

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Thayan Mina

Thayan Mina

Thayan Mina, graduando em jornalismo pela UERJ, é músico e sambista.

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