A partir do dia 2 de maio, o Brasil receberá pela primeira vez a visita de uma representante da Organização das Nações Unidas (ONU) para investigar riscos de genocídio contra uma população. A responsável pela investigação é a queniana Alice Wairimu Nderitu, conselheira especial do secretário-geral para a Prevenção de Genocídio, que ficará no país até 12 de maio para acompanhar de perto a situação dos povos indígenas e da comunidade afrobrasileira.
A visita foi autorizada pelo governo brasileiro, um gesto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de comprometimento com a pauta dos direitos humanos. Além disso, pode ser uma forma de expor o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que atualmente enfrenta denúncias no Tribunal Penal Internacional por genocídio dos povos indígenas.
O objetivo da visita, segundo documento obtido pelo UOL, é que “a assessora especial realize consultas com altos funcionários do governo e outros parceiros relevantes sobre seu mandato”. Somado a isso, “enquanto estiver no país, Nderitu também gostaria de aproveitar a oportunidade e fazer uma visita de cortesia ao chefe de Estado, Luiz Inácio Lula da Silva”, solicita a carta oficial da ONU.
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Ao final da visita, a representante produzirá um informe que será submetido ao secretário-geral da ONU, António Guterres. O governo brasileiro pretende usar as futuras recomendações e críticas para fortalecer seu posicionamento, aperfeiçoar políticas de direitos humanos e obter material para fomentar eventuais processos contra Bolsonaro e seus aliados.
Agenda
A agenda da representante da ONU terá dois temas centrais: A situação dos povos indígenas no país, em especial a região yanomami, mas sem se limitar ao Norte do Brasil. As entidades de direitos humanos também espera incluir a cidade de Dourados (MS) na missão, com o intuito de investigar a crise que atravessa o povo guarani-kaiowá; visitar as comunidades da periferia do Rio de Janeiro com o foco na situação da população afrobrasileira, principalmente na comunidade de Jacarezinho.
A escolha se baseia na preocupação com o avanço das invasões dos territórios indígenas. Segundo informe que será apresentado nesta quarta feira pelo Instituto Vladimir Herzog, os últimos anos registraram “os maiores índices de invasão de terras indígenas da história”. Conforme dados do Conselho Missionário Indigenista de 2020, os casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio” cresceram, em relação ao já preocupante número registrado no primeiro ano do governo Bolsonaro.
Foram 263 casos que em 2020 atingiram pelo menos 201 terras indígenas, de 145 povos, em 19 estados – um acréscimo de 137% em relação a 2018, apontam os dados. Outros números que chamam a atenção são os de ataques e mortes de indígenas, incluindo crianças, por parte de garimpeiros, posseiros e latifundiários. De acordo com o Conselho Missionário Indigenista, em 2020, foram 182 assassinatos de indígenas, 63% mais do que em 2019, quando 113 indígenas foram assassinados.
A realidade da população negra também é uma preocupação internacional. Conforme dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2020 mais de 6,4 mil brasileiros foram mortos por intervenção policial. Naquele ano, 78,9% eram negros. Silvio Almeida, em sua posse como ministro de Direitos Humanos, deixou claro que uma de suas prioridades é combater a violência do Estado.
“Nosso maior compromisso será lutar contra a violência, sobretudo a violência estatal. Isso significa, dentre outras coisas, lutar contra o assassinato de jovens pobres e negros, lutar contra um direito administrativo que rouba camelôs, expulsa crianças da escola, fecha postos de saúde, recolhe pertences de pessoas em situação de rua, e permite agressão contra todos os excluídos e marginalizados da nossa sociedade”, declarou.