Os Guarani e Kaiowá retomaram neste domingo (21) a Fazenda Ipuitã, localizada dentro da Terra Indígena (TI) Guyraroká, em Caarapó (MS). A área foi declarada pela Funai como de ocupação tradicional, mas ainda aguarda a conclusão do processo de homologação. Segundo os indígenas, a ação teve como objetivo impedir a pulverização descontrolada de agrotóxicos sobre a comunidade, denunciada nacional e internacionalmente. A Funai ainda não se manifestou sobre a retomada, e os Guarani e Kaiowá reivindicam a presença do órgão.
A notícia foi dada em primeira mão pelo portal do Conselho Missionário Indigenista (CIMI), que afirma que policiais civis e militares, acompanhados pelo Departamento de Operações de Fronteira (DOF), estiveram no local e ameaçaram prender os indígenas alegando a existência de reféns, o que o grupo nega.
Eles resistiram, e as forças policiais informaram que retornariam com reforços. A situação preocupa porque anciãos e crianças são os mais afetados, e centenas de Guarani e Kaiowá permanecem deslocados por toda a região sul do estado. A Força Nacional de Segurança está a caminho da área, e há risco de ataques, principalmente à noite. Historicamente, a TI Guyraroká já sofreu remoções forçadas, ameaças, agressões e atropelamentos devido à disputa fundiária.

Os indígenas relatam que perderam quatro toneladas de sementes, já que os agrotóxicos fazem com que insetos e micro-organismos destruam as plantações, causando insegurança alimentar. Além disso, as plantas que sobrevivem aos ataques químicos acabam “queimadas” pelos venenos. O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) movem ações judiciais para responsabilizar os produtores pelos ataques químicos, que atingem casas e até a escola indígena.
Em julho deste ano, operação conjunta do Ibama, Força Nacional e polícias estaduais resultou na apreensão de 202 kg de agrotóxicos contrabandeados do Paraguai, encontrados em depósitos clandestinos dentro da TI. Os Guarani e Kaiowá também possuem registros em vídeo da pulverização sobre a aldeia. “Chamam a gente de resistente ao veneno, que só se arranca com a enxada. Começou ontem o despejo, o cheiro é insuportável. Infelizmente isso se normalizou, mas somos seres humanos”, disse Erileide Guarani Kaiowá em outubro de 2024.
Em 2022, Erileide denunciou ataques químicos contra a comunidade durante a Revisão Periódica Universal na ONU, em Genebra. Casos graves de intoxicação infantil também foram registrados, como em maio de 2019, quando quatro crianças e dois adolescentes precisaram de atendimento médico após contato com calcário e agrotóxicos próximos à escola indígena.
Em agosto de 2024, o relator da CIDH para Povos Indígenas, Arif Bulkan, visitou a TI e ouviu membros da comunidade, incluindo Tito Vilhalva, de 108 anos, que afirmou desejar ver a demarcação da terra concluída para seus descendentes. O caso tramita na CIDH, que pode definir prazos para o Estado brasileiro ou encaminhar o processo à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Atualmente, os Guarani e Kaiowá ocupam apenas 50 hectares da TI Guyraroká, cercados por fazendas, vivendo confinados e sem condições de plantar. “Estamos em um pequeno espaço, sem condições de plantar, sendo pulverizados por agrotóxicos, e não há encaminhamento para garantir nosso território, mesmo com a Funai já tendo declarado”, disse Erileide.
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