O estudo “A Intersecção entre Renda, Raça e Desempenho Acadêmico no Acesso ao Ensino Superior” cruzou a renda per capita das famílias dos estudantes, sua raça e o seu desempenho no Enem e concluiu algo que pessoas negras já identificam há muito tempo: a desigualdade racial impacta a possibilidade de se matricular em faculdades.
A pesquisa cruzou dados de 1,12 milhão de alunos, resultados do Enem e informações do Censo da Educação.
As oportunidades não são somente maiores para os ricos do que para os pobres em geral. Pobres negros enfrentam mais dificuldade para entrar no ensino superior do que pobres brancos.
O estudo joga luz sobre o debate em torno da Lei de Cotas, que deve ser revisada pelo novo Congresso.
“Há, no Brasil, uma ideia de que há desvantagens apenas socioeconômicas e que os pretos são prejudicados porque são a maioria dentre os pobres, e não em razão do racismo”, diz Flavio Carvalhaes, um dos autores da pesquisa.
“Fomos, então, avaliar os resultados em cada faixa de renda. Se a desigualdade só tem a ver com isso, o resultado de brancos e pretos dentro do mesmo nível socioeconômico teria que ser igual. E não é isso o que acontece”, aponta ele, coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre a Desigualdade da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pesquisador visitante do Instituto de Estudos da América Latina da Universidade Columbia (EUA).
O estudo analisou o desempenho de 1,12 milhão de alunos que se formaram no ensino médio do Brasil em 2012, ano da aprovação da Lei de Cotas. Por meio do CPF de cada um, a pesquisa verificou os resultados desses estudantes no Enem entre 2012 e 2016 e rastreou, no Censo da Educação Superior, quais deles se matricularam em faculdades entre 2013 e 2017.
Quanto maior a renda, melhor a nota. Além disso, em cada faixa de renda, os brancos têm notas sempre maiores do que os pretos, pardos e indígenas.
Na faixa de renda mais baixa, a de até 0,25 salário mínimo per capita (R$ 303, em valores atuais), a mediana das notas dos brancos é 468,83, e a dos pretos, pardos e indígenas, de 455,3.
A mediana é a nota central de cada grupo –50% dos alunos estão acima dessa marca, e os outro 50%, abaixo.
Na faixa de maior renda, com mais de 1,75 salário mínimo per capita (R$ 2.121 em valores atuais), a mediana das notas dos brancos é de 610,13, e a dos pretos, pardos e indígenas, de 585,83.
Dentre os jovens que prestaram o Enem e são de famílias que ganham até 0,25 salário mínimo per capita, 55% dos brancos entraram no ensino superior, enquanto no caso dos PPIs o número cai para 44%. A desigualdade se reduz com o aumento da renda, mas não desaparece. Na faixa das famílias acima de 1,75 salário mínimo per capita, a diferença é de 96% para 94%.
Fonte: Folha de S. Paulo