De Nova Sussuarana ao Alto das Pombas, ausência de lixeiras afeta a vida nas periferias de Salvador

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*Matéria veiculada originalmente pelo Coletivo Entre Becos e replicada na íntegra pelo Notícia Preta

“Não há lixeiras individuais aqui no bairro, os moradores depositam nos postes ou em caçambas, que são insuficientes. Nos bairros nobres ou turísticos, porém, são encontradas lixeiras tanto no chão quanto nos postes e dispostas com frequência, enquanto nas favelas não há nenhuma”, relata o estudante Gabriel Santana, 25, morador de Nova Sussuarana, em Salvador.

Em todo o bairro onde ele mora, com pouco mais de 12 mil habitantesé difícil encontrar lixeiras individuais, geralmente fixadas em postes. Há sete caçambas para o descarte do lixo, consideradas insuficientes pelos moradores. Já em Ondina e Jardim Apipema, áreas nobres de Salvador, dezenas de lixeiras individuais estão espalhadas pelas ruas em trechos semelhantes de extensão.

Foto: Lis Pedreira/Entre Becos

Na Avenida Milton Santos, em Ondina, por exemplo, que mede 1,1 km, há 47 lixeiras individuais. Já na rua Professor Sabino Silva, no Jardim Apipema, com seus 1,2 km, são 31 equipamentos, todos de responsabilidade da prefeitura de Salvador, por meio da Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpurb).

Estudante de biologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA), Gabriel considera a situação uma falta de cuidado em relação aos moradores de bairros de classe média e alta:

“De forma simples, é um descaso explícito. Fica perceptível que não há somente falta de atenção com o lixo, mas também um descuido com as pessoas, porque além de não haver uma coleta seletiva, também não há preocupação com as doenças vinculadas ao descarte indevido”.

Para Ailton Ferreira, sociólogo e professor da Ufba, essa forma de distribuição das papeleiras denuncia uma desigualdade que age de forma sutil, mas que reforça estigmas históricos sobre as periferias e configura racismo ambiental. Ele também questiona a localização dos contêineres disponibilizados nos bairros periféricos.

“Hoje, o que nós temos em bairros periféricos são contêineres de lixo, também mal localizados. Os contêineres normalmente e estranhamente ficam em portas de escolas e de posto de saúde. Isso também é racismo ambiental, porque quando você chega em alguns bairros nobres, mesmo que em pouca quantidade, você encontra algumas lixeiras”.

A história se repete

No Alto das Pombas, bairro próximo a pontos turísticos como o Farol da Barra e circuitos do Carnaval, a situação se repete. “Faz diferença não ter lixeiras, porque as ruas ficam sujas. Na Barra e em Ondina são várias lixeiras, até em bancos públicos, mas nos bairros periféricos é muito raro. Você encontra um contêiner, mas lixeiras não”, diz Marília Leão, 40, cuidadora de crianças e mãe de três filhos.

Moradora do bairro, Marília observa um descompasso entre a teoria nas escolas e a prática no dia a dia. Ela relata que incentiva os filhos a descartar o lixo corretamente, mas a falta de equipamentos dificulta a prática.

“É muito fácil na escola ter palestras de educação ambiental, mas quando você passa no seu bairro, que é viela, que é periférico, não tem a lixeira, então, ninguém, nem criança e nem adulto, quer ficar se deslocando com lixo na mão por quilômetros”, finaliza.

Embora atendidos pelo serviço de coleta de lixo por meio das caçambas, geralmente instaladas na entrada ou nos finais de linha dos bairros, moradores reivindicam tratamento equivalente ao dado às áreas de classe média e alta.

Foto: Lis Pedreira/Entre Becos

Em nota, a Prefeitura Municipal de Salvador, por meio da Limpurb, diz que a distribuição destes equipamentos é feita de maneira igualitária por toda cidade, e de acordo com os locais de grande circulação de pessoas e que estejam contemplados com os serviços de varrição das vias para que seja feita a devida manutenção (esvaziamento e limpeza) do equipamento.

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A prefeitura também informa que cada equipamento tem uma finalidade. As papeleiras, vinculadas ao serviço de varrição, são destinadas a resíduos de pequeno porte, descartados por pedestres durante a circulação nas vias públicas, como papéis de bala, embalagens de alimentos e garrafas plásticas.

Já as caixas e contêineres estacionários, vinculados ao serviço de coleta, são utilizados para o depósito de resíduos domiciliares, ou seja, aqueles gerados nas residências e apresentados para a coleta regular, especialmente em áreas onde o caminhão de coleta não consegue acessar.

A quantidade das lixeiras individuais citadas nesta reportagem é resultado de uma contagem realizada pelo Entre Becos durante o mês de setembro de 2025.

Reportagem de Jackson Souza, edição de Rosana Silva e Cleber Arruda e fotografia de Lis Pedreira, integrantes do Coletivo Entre Becos

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