Um recente relatório da Cátedra Çarê-IEPS, resultado da colaboração entre o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e o Instituto Çarê, mostrou dados preocupantes sobre as disparidades raciais nas mortes por disparo de arma de fogo em vias públicas no Brasil. Em 2022, 10.764 homens negros perderam a vida nessas circunstâncias, comparados a 2.406 homens brancos.
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Os números mostram uma diferença de quatro vezes mais mortes entre os negros. A pesquisa, que analisou dados de 2012 a 2022, destaca que as relações étnico-raciais e a violência são fatores críticos que impactam a saúde pública. As conclusões apontam que, ao longo dos anos, a violência letal afetou desproporcionalmente a população negra.
Entre 2012 e 2018, por exemplo, as mortes de homens negros por disparos de armas de fogo em vias públicas foram o dobro das de homens brancos. Em janeiro de 2017, um dos picos históricos, a taxa mensal de mortes de homens negros foi de 2,79 por 100 mil habitantes, enquanto para homens brancos foi de 0,9 por 100 mil habitantes. Isso traduz-se em 1.588 mortes de homens negros contra 399 homens brancos naquele mês específico.
Embora tenha havido uma redução na mortalidade total entre 2019 e 2022, a discrepância racial persistiu. Rony Coelho, pesquisador do IEPS, reforça que os dados refletem as profundas desigualdades estruturais no Brasil, isso evidencia uma maior vulnerabilidade da população negra a diferentes formas de violência. Ele ressalta que essa população não apenas sofre mais com a violência letal, mas também enfrenta um maior número de agressões que resultam em hospitalizações.
“O Boletim apresenta uma dura realidade já conhecida contra a população negra, representada por desigualdades nos dados de segurança pública, saúde, mortalidade e de internações hospitalares. O que chama atenção nos dados é que a população negra não sofre somente com a violência letal, mas também é mais atingida por agressões que levam a hospitalizações. Ou seja, enfrenta a violência de forma generalizada” destacou.
Mulheres negras também sofrem mais com a violência
O cenário é igualmente preocupante para as mulheres negras. Entre 2012 e 2022, as taxas de mortalidade por disparos de arma de fogo em vias públicas para mulheres negras superaram significativamente as das mulheres brancas.
Em 2018, no auge dessa série histórica, a taxa mensal de óbitos de mulheres negras ultrapassou 0,10 mortes por 100 mil habitantes, enquanto para mulheres brancas foi abaixo de 0,05 por 100 mil habitantes. Em 2022, 629 mulheres negras morreram em vias públicas devido a disparos de arma de fogo, contra 207 mulheres brancas, representando uma diferença de três vezes mais mortes.
Além das mortes em vias públicas, as mulheres negras também estão mais vulneráveis em outros locais e tipos de agressão. Em 2012, por exemplo, houve 814 mortes de mulheres negras em vias públicas, 631 no domicílio e 654 em hospitais. Para mulheres brancas, os números foram 302, 422 e 342, respectivamente.
Disparidades em todas as formas de agressão
O boletim também analisou a mortalidade decorrente de todos os tipos de agressões, como aquelas causadas por objetos cortantes, agressões físicas e disparos de arma de fogo. Em todas as categorias, pessoas negras morreram mais do que pessoas brancas.
Em 2012, a média mensal de mortes por agressões foi de 1.196 brancos contra 3.188 negros. Em 2017, ano com maior média mensal, foram 1.166 mortes de brancos contra 4.008 de negros. Em 2022, esses números foram 747 mortes de brancos e 2.712 de negros, uma proporção três vezes maior para a população negra.
Aumento nas internações por agressões
O estudo também revelou aumento nas internações de pessoas negras devido a agressões. Entre 2012 e 2022, os registros de internações saltaram de uma média móvel de 1.146 em dezembro de 2012 para 2.745 em dezembro de 2022. As médias móveis das taxas de internações aumentaram de 0,107 para 0,228 no mesmo período, refletindo um aumento de 113%.
Esse aumento nos registros de internações pode ser parcialmente explicado pela melhoria na coleta e registro de dados de raça/cor no Sistema de Informações Hospitalares (SIH). Houve uma redução na proporção de dados “sem informação” para raça/cor, indicando uma coleta mais completa de dados ao longo do tempo.
Jovens negros são os mais afetados
A pesquisa destacou que entre 2010 e 2021, jovens negros de 18 a 24 anos apresentaram as maiores taxas de mortalidade em comparação com jovens brancos. Essa discrepância racial é evidente na maioria das faixas etárias masculinas e só começa a diminuir a partir dos 45 anos.
Embora as mulheres registrem taxas de mortalidade geral inferiores às dos homens, as desigualdades raciais permanecem. Mulheres negras têm taxas ligeiramente mais altas de mortalidade em comparação com mulheres brancas, embora as diferenças sejam menos pronunciadas do que entre os homens.
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