*Matéria veiculada originalmente no Jornal de Alagoas e reproduzida com autorização e creditada ao veículo e ao repórter Vinicius Rocha
Uma pesquisa da ONG Ateliê Ambrosina revela que 83% das ruas de Maceió com nomes de pessoas homenageiam homens brancos. De acordo com o levantamento, Maceió possuía, em 2015, 7.139 logradouros e 56% deles, ou 3.986, com nomes de pessoas, personalidades e santidades.
Foi constatado então que os bairros de Maceió priorizam a homenagem a homens em seus logradouros, com visibilidade de 3.300 nomes masculinos, comparado apenas 651 nomes femininos.
A fundadora da Ateliê Ambrosina, Bruna Teixeira, explica que a pesquisa teve início em 2017, mas ganhou força em 2019 quando a gestão do município, à época comandada por Rui Palmeira, solicitou à sociedade civil sugestão de nomes de mulheres para nomear as ruas da cidade.
Foram levantados, então, 200 nomes de mulheres e pessoas transexuais que viraram sugestões para ganhar o devido reconhecimento. Bruna afirma que a medida é uma forma de garantir equidade e representatividade para as mulheres e grupos invisibilizados. “Nós queremos nos reconhecer a cada esquina”, diz.
Outro “sintoma” do machismo estrutural que circunda a sociedade maceioense através das pessoas a quem se escolhe homenagear é que grande parte dos nomes de homens são identificados pelos seus títulos, como coronéis, capitães, entre outros, enquanto os 20% que “sobram” para as mulheres são de títulos como santas ou donas.
“A gente luta muito pela equidade, e temos a expectativa de que Maceió se preocupe com as questões de representatividade, pois há uma discrepância muito grande. Representatividade parece pouco, mas para quem não é representada é muito”.
Um caso emblemático da cidade de Maceió, aponta Bruna, é o de Tia Marcelina, líder religiosa morta no ato de intolerância conhecido como Quebra de Xangô, em 1912. O episódio foi capitaneado por Fernandes Lima, que dá nome ao principal eixo viário da cidade. “Homenageia o algoz, enquanto a vítima é invisibilizada”, diz.
Em entrevista recente, a vereadora Teca Nelma (PT) disse que após procurar a antiga SEDET – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente – atual Semurb, constatou-se 800 ruas sem nome na capital alagoana. “Junto com o Ateliê, a partir da pesquisa, protocolamos cerca de 195 nomes na Câmara”.
Ela lamenta, porém, que o processo de inclusão desses nomes foi interrompido a partir de uma Lei instituída na Câmara de Maceió que limitou para apenas cinco projetos de nomes de rua por vereador por semestre em Maceió. “Eu protocolei a Rua Marielle Franco e foi quando tudo travou na Câmara. Me perguntaram o que aconteceria se fosse proposto uma rua Olavo de Carvalho”, relatou a vereadora, sem citar nomes de quem fez o questionamento.
“É a primeira [lei] do Brasil, porque não existe limitação na constituição. Além disso, a Lei retroage, todos os processos que foram protocolados têm que ser arquivados porque nenhum deles segue a prerrogativa de cinco por semestre“, completou Teca.
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Bruna, no entanto, lamenta a rejeição enfrentada por Teca na Câmara, mas acredita que a pauta possa avançar e o número de homenagens possa ser mais equilibrado em Maceió. “Não é pra tirar os nomes dos homens que já existem, mas que ruas novas homenageiem mulheres”, sintetiza.
Virou filme
A pesquisa da ONG não só virou projeto na Câmara de Maceió, mas também vai parar nas telas do cinema, com o filme “Se Essas Ruas Fossem Delas”, dirigido por Ticiane Simões, também fundadora da Ateliê Ambrosina. Atualmente, o filme está em fase de pós-produção e deverá estrear na Mostra Sururu de cinema alagoano, em dezembro de 2024.