“Mãe Beata de Iemanjá dizia que nós queremos ser respeitados, não tolerados”, diz Pai Rodney no NP Notícias

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No programa NP Notícias desta quarta-feira (28), Pai Rodney falou com a jornalista Thais Bernardes sobre temas urgentes que atravessam o cotidiano das religiões de matriz africana no Brasil: a disputa religiosa, o racismo estrutural e o poder na política institucional. Com falas contundentes e emocionadas, ele evocou o legado de Mãe Beata de Iemanjá, fez críticas ao apagamento cultural promovido por setores neopentecostais e apontou a importância de Exu na comunicação e na luta antirracista.

Pai Rodney iniciou a entrevista citando Mãe Beata de Iemanjá, figura fundamental nas religiões de matriz africana. Segundo ele, “Mãe Beata dizia que nós queremos ser respeitados, não tolerados”, destacando que o termo “intolerância” não abarca a gravidade das violências enfrentadas por esses povos. Para ele, o que há é racismo religioso – uma forma direta de perseguição motivada pela origem negra das tradições afro-brasileiras.

O convidado ressaltou que manifestações culturais como o samba, a capoeira e os próprios terreiros sempre foram alvos de criminalização e tentativa de extermínio. “Essa perseguição acontece porque a nossa tradição é de origem negra”, afirmou, chamando atenção para o modo como o racismo atravessa as instituições e determina quem pode exercer poder e ser ouvido. Para ele, combater esse racismo é uma tarefa política urgente.

Ele ainda refletiu sobre a conversão de pessoas negras ao neopentecostalismo como parte de uma estratégia mais ampla de apagamento cultural. Embora reconheça o direito de escolha religiosa, Pai Rodney alertou que, muitas vezes, essa conversão ocorre em contextos que silenciam as pautas raciais. “Raça, do ponto de vista social e político, ainda determina os lugares de exclusão. Por isso, precisamos ocupar os espaços de poder para transformar a nossa realidade.”

Aculturação ou apropriação: os limites da convivência entre tradições

Durante a conversa, Pai Rodney analisou o fenômeno do sincretismo religioso em igrejas neopentecostais pretas, afirmando que há uma presença visível de elementos das religiões africanas nesses ambientes. “Ninguém troca uma religião antiga por uma nova sem que os elementos da antiga estejam presentes na nova”, disse. Para ele, há um processo de aculturação nesses espaços, onde a ancestralidade do corpo negro se manifesta mesmo sob outras linguagens.

No entanto, o pai de santo fez questão de distinguir aculturação de apropriação cultural. Enquanto a primeira envolve trocas e convivência, a segunda implica apagamento e roubo. “Quando as pessoas se apropriam dos nossos elementos culturais, estão nos roubando e promovendo um apagamento como forma de aniquilar nosso povo”, afirmou. A apropriação, segundo ele, é uma ferramenta do racismo e da desumanização.

Pai Rodney Willian participou do NP Notícias e debateu sobre disputa religiosa, racismo e poder nas eleições e na política institucional –  Foto: Reprodução/Youtube.

Essa violência simbólica se manifesta também quando se tenta “integrar” povos indígenas ou afrodescendentes à cultura dominante. “O que estão dizendo é que precisam deixar de ser quem são”, denunciou Pai Rodney. Para ele, a preservação da identidade cultural é um ato de resistência e existência. “Desumanizar é o que caracteriza o racismo, e a apropriação cultural é um dos seus instrumentos mais perversos.”

Exú o orixá da comunicação

Encerrando a entrevista, Pai Rodney trouxe Exu para o centro da conversa, lembrando que ele é o orixá da comunicação e da abertura de caminhos. “Exu fala todas as línguas… acessa todas as formas de comunicação”, explicou. Para ele, o domínio das redes sociais por parte dos terreiros tem sido uma resposta eficaz à hegemonia evangélica nos meios de comunicação tradicionais.

Durante a pandemia, segundo ele, as religiões de matriz africana encontraram nas redes uma forma de manter o contato com o povo e expandir seu alcance. Lives com milhares de espectadores tornaram-se momentos de acolhimento, cura e disseminação de saberes ancestrais. “A pandemia foi um momento de dor, mas também de conexão. As redes nos ajudaram a manter vivo o elo com nossa comunidade e nossa luta.”

Pai Rodney concluiu destacando que fazer política é comunicar, e que as encruzilhadas – tão simbólicas nas tradições afro-brasileiras – não são lugares de impasse, mas de encontro. “A encruzilhada é um ponto de convergência. Usamos todas as premissas que Exu nos traz para fazer com que nossa voz ecoe por todos os continentes.” A comunicação, para ele, é uma ferramenta de poder e resistência que pode mudar a situação do povo negro no Brasil.

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Thayan Mina

Thayan Mina

Thayan Mina, graduando em jornalismo pela UERJ, é músico e sambista.

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