Ecotrilha Literária promove doação de livros e preservação na periferia

IMG-20210408-WA0056.jpg
Trilheiros durante uma das caminhadas pelo Morro Santana – Foto: Ecotrilha Literária

A ação comunitária Ecotrilha Literária pelo Morro Santana, em Porto Alegre (RS), foi criada com a intenção de que os trilheiros, ao participar da caminhada, doem livros para a biblioteca comunitária Visão Periférica, localizada na Vila das Laranjeiras, no Morro Santana. Além disso, durante o caminho de subida ao Morro, quem está participando da trilha pode plantar mudas de árvores com a intenção de preservar a vegetação do lugar.

O Notícia Preta entrevistou o fundador e coordenador da organização Visão Periférica, Sidney Costa, que revelou qual a principal missão da Ecotrilha Literária. “A intenção é arrecadar livros e plantas. Os livros são para manter o acervo da biblioteca e as plantas são para uma reparação ambiental, a fim de prover sustentabilidade e geração de elementos orgânicos futuros para as próximas gerações, e aproximar as pessoas que participam dessa atividade para um contato com a natureza”, conta.

Segundo Sidney, a Ecotrilha Literária possui 9 quilômetros de trajeto. Ele conta o porquê da organização ter este nome. “A Ecotrilha Literária tem este título porque, após os 9 km de trajeto, em meio a pausas para descanso, contemplação, reflexões, informações, troca de ideias e vivências, nós realizamos um sarau com a participação dos trilheiros e trilheiras dessa atividade, por isso se chama Ecotrilha Literária”, relata

Geração de renda e enraizamento comunitário no Morro Santana, estas são algumas das missões práticas da Ecotrilha Literária. Ainda de acordo com Sidney, as pessoas que procuram fazer a Ecotrilha no Morro Santana, podem ter uma imersão, uma perspectiva da comunidade, passar pelo meio da vila, pelos becos, pela biblioteca. “Elas terão uma noção da realidade dos moradores, situações que estão no dia a dia da comunidade, que é desassistida pelos poderes públicos. Deixamos a quem queira ver como é o cotidiano, porém, não de forma turística, e sim de expor para buscar um auxílio para soluções”, comenta.

Sidney relata ainda que algumas vezes aparecem pessoas que contribuem para a melhoria e para sanar estas problemáticas citadas, isso é a base do enraizamento comunitário. “Em relação à geração de renda, parte do que gera com a Ecotrilha é dividida com os guias locais, outra parte para os projetos sociais da comunidade. Desta forma, também gera renda para comércios locais, movimentando e economia solidária local”, ressalta Sidney.

Processo educacional promovido pela trilha

A Ecotrilha Literária também preenche as necessidades educacionais para a população residente do Morro Santana. “Como o ato de fundação, a intenção é ofertar reparações socioambientais por meio do empreendedorismo, levando esses serviços de impacto social e outros na área da educação e cultura para a comunidade e para além dela, mas sempre pensando em quem mora na localidade”, afirma.

Além disso, para deixar a trilha mais emocionante, a organização prepara uma aula histórica sobre o Morro Santana. “Nós trazemos informações do Morro Santana desde a época das Sesmarias. O Morro Santana foi o primeiro local colonizado de Porto Alegre, por Jerônimo de Ornelas, e trazemos essas informações de forma recreativa, não como uma forma metodológica de ensino, são pinceladas, durante as abordagens da Ecotrilha,  informações sobre as plantas nativas e como surgiu a comunidade. Sobre a Pedreira, que é a cratera formada pela antiga mineradora que teve no Morro Santana. A ideia é trazer conscientização e informação em um trajeto descontraído”, relata Sidney.  

Sidney Costa, fundador e coordenador da Ecotrilha Literária e da biblioteca comunitária Visão Periférica – Foto: Arquivo Pessoal

Ataques a vegetação do Morro Santana

O Morro Santana já sofreu alguns ataques, através de incêndios nas áreas de vegetação, e, nos últimos dois anos, estes ataques têm sido mais intensos. Plantar, preservando a vegetação desses espaços, pode se entender como uma forma de manifestação contra esses ataques. “Promover a Ecotrilha Literária, tem o intuito de que se preserve o espaço, é uma forma de manifestar, mas, mais do que manifestar, é uma forma de trazer a conscientização e empoderar as pessoas no sentido de que o meio ambiente precisa ser preservado, que é necessária essa conscientização ecológica, essa manutenção do espaço. Além disso, é importante trazer as pessoas para conhecer de perto, ver a realidade da comunidade, ver a realidade da fauna e flora, que é abundante, e precisa dessa manutenção e preservação, trabalhando essa conscientização junto da comunidade, para ela e além dela. Em toda cidade”, enfatiza o fundador e coordenador.

Biblioteca Comunitária Visão Periférica

A biblioteca Visão Periférica é uma ação comunitária assistida pela Ecotrilha Literária, com o objetivo de preservar o espaço com doações de livros para a comunidade, com o lema de levar “Acesso ao Livro, Leitura, Literatura, Escrita, Biblioteca, Vivências Ecológicas e Culturais como Direitos Humanos”. Sidney nos conta a história da criação do nome da biblioteca. “Há alguns anos, quando tive a ideia de montar a organização, como um dos princípios o impacto social, ainda me faltava nome e, antes de ofertar a Ecotrilha para pessoas do Morro e fora dele, eu já subia o Morro enquanto morador. Subia para fazer minhas orações e levar a minha pet, e em uma dessa tardes com ela, vendo o pôr do Sol, estava contemplando e mirando a cidade, buscando inspiração para o nome. Em um dos momentos olhando para o céu, girei a minha cabeça e me veio a inspiração, pois na visão periférica, a cidade fica tão linda. Na hora me deu o estalo, pensando no duplo sentido, da amplitude periférica do olhar, como também na questão da perspectiva da periferia”, revela.

Desde 2014, a biblioteca garante o espaço e acesso a livros, leitura e literatura para as pessoas da comunidade do Morro Santana e, segundo Sidney, a intenção é oportunizar à comunidade acessos que normalmente tem que ir para a área central para acessar um bom acervo. “Para assistir um filme, para ver uma peça de teatro, para fazer uma oficina de música, para fazer um curso, até mesmo para fazer um passeio, muita das vezes, as pessoas da comunidade tem que se deslocar. Então, temos a intenção de descentralizar a cultura, os acessos e garantia dos direitos humanos, oportunizando este espaço que, através de uma biblioteca viva, que para além do livro, oferece outras formas de cultura para a comunidade”, conta o fundador.

Para acessar os livros da biblioteca Visão Periférica, é necessário somente fazer um cadastro e retirar o livro que gostaria de ler. “As pessoas acessam os livros através de empréstimos, elas vêm até a biblioteca, fazem um cadastro simples com a Identidade, às vezes somente dando o nome e o endereço, e assim podem retirar o livro para fazer uso com a sua família em casa, as crianças que atendemos têm acesso aos livros através da nossa mediação de leitura e também através do empréstimo, junto de organizações parceiras como creches e a Sociedade de Assistência Social e Educacional (os antigos SASE)”, diz Sidney.

A Ecotrilha Literária em tempos de Pandemia

Tanto a acessibilidade da biblioteca quanto a realização das trilhas, sofreram mudanças por conta da pandemia do novo Coronavírus. Contudo, a ação continua funcionando através de doações e parcerias. “Respeitando os protocolos, temos feito ações mais administrativas e atuação online nas redes sociais, junto à Rede de Bibliotecas Comunitárias, chamada BeaBah, (Bibliotecas Comunitárias do Rio Grande do Sul), então, atualmente, fazemos um circuito de atividades conectadas com as outras bibliotecas. Em relação às trilhas, por conta da pandemia, infelizmente não estamos podendo fazer, era uma das fontes de renda para a comunidade, articuladores, guias locais e para comércios locais. Porém, neste momento, estamos nos mantendo com doações, acesso a alguns editais e formas alternativas de geração de renda”, lamenta Sidney.

Panfleto de divulgação da Ecotrilha – Foto: Ecotrilha Literária

Em 2020, a Visão Periférica juntamente com a rede de bibliotecas, a BeaBah, e também com o Fundo de Apoio às Mulheres de Porto Alegre, realizaram uma distribuição de cestas básicas para moradores do Morro Santana. Sidney, nos conta o porquê decidiram levantar essa ação. “Junto com o auxílio dessas duas organizações, nós conseguimos arrecadar algumas toneladas de alimentos que, no Morro Santana, conseguimos contemplar mais de 800 pessoas diretamente, com cestas básicas, material de higiene, livros. Por conta da Pandemia, muitas pessoas perderam emprego, não conseguiam se mobilizar, não tinham como gerar renda, não tinham como se deslocar para trabalhar e, na periferia, isso ficou muito visível, porque em grande maioria, os mais afetados, além de periféricos, são mulheres e crianças pretas, e, entendendo essa vulnerabilidade ainda mais evidente, junto da BeaBah, acessamos um edital que nos auxiliou a arrecadar essa compra das cestas básicas e junto ao Fundo de Apoio às Mulheres, conseguimos arrecadar ainda mais alimentos e auxiliar essas mães para com as suas famílias”, finalizou.

Leia também: Levantamento aponta que número de famílias que dependem de ONG’s aumentou durante a pandemia

Deixe uma resposta

scroll to top