DJ acusa motorista de Uber que interrompeu viagem para chamar a polícia: “racismo estrutural”

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O que era para ser uma noite normal na vida de Diego Zakarias da Silva acabou envolvendo polícia e constrangimento. Na última segunda feira (27), o jovem, de 26 anos, pediu um Uber quando saía da casa da mãe, no Engenho Novo, na Zona Norte do Rio, em direção ao Méier, também na Zona Norte, onde iria deixar sua prima de 18 anos. De lá, seguiria para a Barra da Tijuca, na Zona Oeste, onde iria trabalhar. Diego, que é conhecido como DJ Pelé, atua na noite carioca há quase 10 anos e iria se apresentar numa boate. Mas a situação tomou outro rumo logo que o rapaz entrou no carro. “Eu estava na casa da minha mãe, é prédio com porteiro, não é comunidade. A casa da minha prima é no Méier e também não fica em comunidade. Quando entrei no carro, o motorista ficou me olhando. Ele era negro também, e eu achei estranho. Quando chegamos no Méier, ele falou que ia parar para abastecer. Paramos, e aí começou” – contou Diego, em entrevista ao Notícia Preta.

DJ Pelé acusa o motorista do aplicativo de racismo estrutural – Foto: Divulgação

“Ele virou para trás e disse: ‘não tem como eu continuar a corrida até a Barra’. Eu não entendi e perguntei: ‘como assim?’. Aí ele falou que a rua das boates era perigosa – o que não faz sentido, porque é o local mais movimentado da noite da Barra. Ele insistiu dizendo que não tinha como e pediu meus documentos. Aí eu falei pra ele: ‘campeão, estou indo trabalhar na Barra”. Ele perguntou se tinha como eu provar que estava indo trabalhar, e eu, com toda a paciência do mundo, peguei meu celular e mostrei o flyer que me anunciava como atração da boate. Aí ele seguiu, deixou minha prima em casa e depois falou: ‘sabe como é, né? É fogo'”, relatou o DJ.

No caminho entre o Méier e a Barra da Tijuca, Diego recebeu uma ligação: era seu produtor, informando que o show havia sido cancelado porque a boate estava vazia. Sendo assim, o rapaz mudou o itinerário pelo aplicativo. Foi a gota d’água para o motorista acionar a polícia.

“A gente estava passando pela Linha Amarela na hora que eu alterei o destino. Botei para ir direto para casa, que é na Vila do Pan, na Barra, condomínio fechado e tudo – longe de comunidade, volto a repetir. Aí o motorista viu uma viatura da polícia militar, que sempre tem ali na Linha Amarela, e parou carro. Falou que não ia prosseguir com a viagem e que ia chamar a polícia. Aí eu falei: ‘chama’. Os policiais vieram, e aí foi a hora em que eu gravei o vídeo”.

As imagens feitas pelo celular de Diego viralizaram. Elas mostram o exato momento em que o motorista deixa o carro para ir falar com os policiais.

“O policial me chamou, depois perguntou o que aconteceu. Eu falei: ‘esse motorista não quer me levar em casa porque está achando que eu vou assaltá-lo’. O policial pediu meu documento e viu que não tinha nada. A viatura ainda me levou para casa depois. Os policiais vieram conversando comigo, na maior tranquilidade, e ainda me pediram desculpas pelo motorista”, disse.

Diego entendeu a situação como mais um fruto do racismo estrutural e aproveitou para falar um pouco sobre o assunto. Para ele, é preciso entender a linha de raciocínio que o motorista, também negro, teve. “O racismo é estrutural, irmão. Eu tenho que entender o que o cara pensou, infelizmente, porque o Brasil é um país racista, a base do país é racista. Todo mundo tem preconceito com a favela, mas qual o passaporte do Brasil? É pagode, samba, funk… E isso tudo é da periferia. Quando sai da periferia e toca na casa de gente famosa, todo mundo dança. Mas quando veem um canto de funk na rua, todo mundo já tem um preconceito, um olhar estranho. Para esse racismo estrutural mudar, é preciso muita coisa. Precisa de um filme com atores negros – um investimento legal para o filme ser comercializado – falando sobre esse assunto. Aqui no Brasil, nós somos 54% da população. Nos Estados Unidos, os negros são 13%. Olha a comparação dos negros de lá com os daqui. Tá entendendo? Os negros lá estão bilionários e investindo nas quebradas deles! Aqui tem negro rico, mas não pode fazer nada, porque a base brasileira não dá espaço para os negros nas grandes indústrias”, refletiu o DJ.

O que diz a Uber

Diego contou que a Uber emitiu uma nota lamentando o episódio e o reembolsou pela corrida. Confira:
“Lamentamos a experiência pela qual o usuário passou em nossa plataforma. A Uber não tolera qualquer forma de discriminação e assim que soubemos do incidente, desativamos o motorista da plataforma. A empresa está à disposição para colaborar com as autoridades responsáveis para investigação do caso, nos termos da lei”.

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